quarta-feira, novembro 29, 2006

Diz-me meu amigo ...


Diz-me meu amigo, de que é feita a Amizade, que sinto e não vejo...
Diz-me meu amigo, se souberes, de que é feito o Silêncio onde gritam os que estão ausentes, que sinto e não vejo...
Diz-me, de que é feito o Amor que arde dentro de mim e me consome, que sinto e não vejo...

Diz-me meu amigo, de que é feita a Tristeza com que a partida nos cobra, que sinto e não vejo...
Diz-me meu amigo, se souberes, de que é feita a Morte com que terminamos, que sinto e não vejo...
Diz-me, de que é feita a Saudade que traça este caminho, que sinto e não vejo...

Diz-me meu amigo, de que é feito o Sentimento com que te lembro, que sinto e não vejo...
Diz-me meu amigo, se souberes, de que é feita a Felicidade com que te encontro, que sinto e não vejo...
Diz-me, de que é feito o Bater do Coração, que sinto e não vejo...

Diz-me meu Amigo, de que é feito o Mundo ... que eu vejo e não sinto.

quarta-feira, novembro 22, 2006

Franchising religioso


Há dias entre dedos e teclas do telecomando, numa azáfama incompreensível do “zapping” televisivo, caí inesperadamente numa sessão televisiva ao serviço da I.U.R.D. (Igreja Universal do Reino de Deus. Decidi submeter-me por instantes àquela retórica, qual teste ao senso que me tende a desconfiar das santas falas com que se embalam os crentes na sua mais respeitável devoção.

Os que não me conhecem, atirar-me-ão decerto, precipitados, as acusações de profano, agnóstico ou ateu.
Os que me conhecem, saberão que para católico, mais cristão me acharão, e que entre cristãos, judeus, hindus, budistas ou muçulmanos e demais crentes, bem me encontro com todos eles, conquanto seja o Homem que se aperfeiçoando se aproxime do Deus que busca e na religião não encontre motivo de exclusão de ninguém nem de atentar contra os que não lhes partilhem o credo ou a falta dele.

Confesso que áparte a convicção religiosa de cada um, existem situações que até a tolerância mais permeável tem dificuldade em aceitar. Aquela sessão, supostamente conduzida por um sacerdote de oratória adequada a um renhido feirante, impondo um produto claramente duvidoso aos que passam, numa missão devota a um franchising religioso, no qual o sotaque brasileiro se tornou condimento habitual.
Até mesmo invocando S.João ao comentarem:

“O ladrão vem somente para roubar, matar e destruir;
eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância”. (João 10:10)

não sendo difícil no entanto em que grupo aqueles falsos sacerdotes se enquadram e não foi para trazer a vida nem a abundância de certeza, que não seja a deles próprios.

Compreendo que todos os credos mereçam respeito e tolerância. Compreendo que não seja fácil avaliar legalmente a idoneidade da actuação das organizações ou seitas religiosas, mas casos há em que a evidência da intoxicação mental é por demais evidente. Não está em causa a boa fé dos crentes, mas a postura e as falsas promessas dos ditos sacerdotes, para os quais a punição antiga do alcatrão e penas de galinha se adequava bem nos paramentos que a justiça popular imporia por castigo ao abuso da boa fé.

quarta-feira, novembro 15, 2006

Gravar na pedra

Diz uma lenda antiga árabe que dois amigos viajavam no deserto e a dado momento discutiram e um deles deu uma bofetada ao outro.
Este ofendido, sem nada dizer, escreveu na areia:

“hoje o meu melhor amigo deu-me uma bofetada na cara”

Os dois continuaram a viagem e chegaram a um oásis, onde resolveram banhar-se. O que tinha sido esbofeteado começou a afogar-se, tendo sido salvo pelo outro.
Depois de recuperado, pegou num cinzel e gravou numa pedra:

“hoje o meu melhor amigo salvou-me a vida”

Intrigado, o amigo perguntou-lhe:
- Porque é que quando te ofendi, escreveste na areia e agora escreveste numa pedra ?

Sorrindo, o outro respondeu:
- Quando um grande amigo nos ofende, devemos escrever na areia, porque o vento do esquecimento e o perdão se encarregam de apagar. Por outro lado, quando nos acontece algo de grandioso, devemos gravá-lo na memória do coração, onde nenhum vento do mundo poderá apagar.
- Basta um minuto para que fixes uma pessoa, uma hora para gostares dela e um dia para a amares. Mas é necessária uma vida para a esqueceres.

segunda-feira, novembro 13, 2006

Hoje ...

Hoje é mais um daqueles dias em que a falibilidade do calendário seria bem vinda e acolhida como se fosse, não um defeito, mas uma qualidade humana, que nos permitiria ignorar alguns dos dias, mesmo quando inevitáveis.

Hoje, o cortejo fúnebre tomou o lugar do começo do dia, remetendo o acordar para um passado distante e acrescido do pesar, mostrando que passo a passo, fazem-se mil caminhos que se encontram num mesmo lugar, onde todas as faces e imagens se pintam de uma mesma cor, intercalando-se entre o branco dos actores e o negro dos espectadores.

Hoje o telefone não toca, e o desejo de falar com alguém sobrepõe-se à companhia dos acompanhantes, como uma sede que a torneira à saída do recindo ignora, incapaz de a satisfazer, juntando-e à impotência que o silêncio nos impõe em momentos de solidão.

Hoje, na ausência dos amigos, os demais tornam-se quase desejados, no vil desejo de ouvir alguém, enquanto rostos desconhecidos passam mudos no caminho de regresso à realidade. Os dedos hesitam nas teclas do telemóvel os nomes que o espaço e o tempo recusam e o instinto toma conta da razão e dos actos, remetendo ao recolher dos sentidos.

Hoje é mais um daqueles dias em que a falibilidade do calendário seria bem vinda, como em todos aqueles em que nos sentimos sós numa viagem que no momento se quer rápida, em que fechamos os olhos e adormecemos, como o único gesto que nos resta.

Com os votos de uma Paz Profunda ao Sr. Manuel Bento, pai do meu compadre e amigo Alexandre Bento.

sexta-feira, novembro 10, 2006

Apenas isso

É apenas um daqueles momentos, em que não me apetece nada em especial, daqueles instantes em que a melancolia toma conta das solas dos sapatos, enquanto as pernas procuram, numa azáfama contrariada, acompahá-los, ainda que a custo.

O rádio anuncia, quase que envergonhado pelo ridículo, que a percentagem de adesão à greve dos funcionários públicos é de algo como 11% segundo um organismo estatal e os sindicatos 80%. Oh quem me dera que quem apurou estes números tivessem a vergonha do meu rádio, com a antena a retorcer-se da mentira que recebera do éter, por onde vagueiam as ondas hertzianas numa imensa bacanal de mentiras acossadas às verdades, qual frenezim de informação que assim, se torna inútil.

Mas valeu-me a notícia de que os astrólogos vão repensar as análises e previsões, agora que Plutão perdeu o estatuto de "planeta". Acho bem que assim seja e oh, como me sinto mais aliviado agora, depois de saber que na minha carta astrológica pode ser emendada na parte que dizia respeito áquele pequeno corpo celeste. Ele que teimava fazer parte do sistema solar como membro de pleno direito, como um deputado de um qualquer partido com direito a dormir no respeitável hemiciclo onde as vozes acordadas e adormecidas, gritos, gemidos e roncos fazem coro num entorpecimento dos sentidos.

Finalmente, as notícias no computador deram-me uma alegria inesperada. Sim, porque nem tudo é mau na vida. Um estudo recente publicado pela revista Science, revela que um grupo internacional de cientistas decifrou a sequência do genoma do ouriço-do-mar e confirmou que é muito semelhante com o do ser humano. Oh que maravilha, oh que prazer sublime, saber que as pontadas que sentia nas costas, podem ter finalmente uma potencial explicação com alguns espinhos que possam aparecer no dorso que teima em manter-se liso. Isto para não mencionar a necessidade agora premente da dupla atenção a usar o papel higiénico, não vá este romper-se numa picada inesperada que possa contaminar o dedo médio na tarefa habitual de limpeza.

De facto, tudo isto roda directa ou indirectamente em torno da ciência. Sim, os cientistas, esses mestres da descoberta na senda de conhecer o desconhecido. Porque não segui eu o desejo de infância de ser cientista ? Sim, eu que a curiosidade me caracterizava no superlativo, o que só era acompanhado pelo pavor constante da minha mãe sobre o que iria acontecer a seguir, sempre que eu perdia a inocência das ligações eléctricas com pilhas e lâmpadas de brinquedos, para aventurar-me na instalação eléctrica lá de casa. Improvisava alarmes e campaínhas que quase matavam de susto quem passasse perto, com relógios armadilhados, montagens e desmontagens de despertadores. Isto além da máquina de costura e outras que a minha mão alcançasse e a distração dos pais, permitisse, quase sempre em processos irreversíveis de reparação, delas e das partes do meu corpo que a minha mãe tocasse em seguida, com ou sem a cumplicidade de uma colher de pau que acabou os dias numa geração espontânea de duas metades, numa reposição do Big-Bang no teatro inocente das minhas costas.

É isso, eu devia ter sido cientista e inventar algo de útil e publicamente reconhecido. Sobretudo agora que o Estado até dá incentivos para que os cientistas se mantenham em solo nacional, quem sabe, na busca da pedra filosofal que permita transformar o chumbo em ouro. Como era bom conseguirem isso. Assim, que animação seria transformar o chumbo existente em cosméticos, nomeadamente nos batons das senhoras. A Lili Caneças ia adorar, ou até a Cinha Jardim e as ricas filhas. Transformavam também o chumbo das munições dos caçadores ou da PSP e GNR que assim, de certeza que já tinha sido possível identificar a origem da bala que paralisou um manifestante sobre a ponte 25 de Abril, porque o imbecil do agente que a disparou e quem o mandou disparar, de certeza que não iam desperdiçar tão valioso objecto.
Pois é, se eu fosse cientista, e como gosto também de biologia, já sei, ia criar um novo ser. Um ser que todos desejassem e se possível, resultante da aplicação das regras da reciclagem, para melhor credenciar a minha invenção.
Inventava algo assim como uma nova forma de marisco. Acredito que era uma boa ideia, de certeza das melhores, algo entre a lagosta e o caranguejo.
Podia aproveitar o Alberto João Jardim para rechear a cabeça, pois que não deve fazer muita diferença, àparte a comestibilidade. Podia aproveitar também a Júlia Pinheiro para a parte vocal, o que iria decerto com os gritos, ajudar a localizar o bicho, onde quer que estivesse, ou até pedir alguma contribuição à Teresa Guilherme para pôr o bicharoco a andar como uma barata tonta, sem sair do mesmo sítio e ajudar à sua apanha.
Pensei também em aplicar um pouco do José Castelo Branco na (in)definição sexual do bichano, o que era uma vantagem porque estava facilitada a escolha para a reprodução.
Na escolha dos braços e pernas, talvez usasse o Major Valentim Loureiro, pois longos são os tentáculos que usa e abusa, tendo de ter o cuidado de não fazer os membros demasiado longos, antes que o bicho se devorasse a ele próprio, com a gula.
Finalmente, ficava a questão da pele e da côr do novo ser das profundezas e aí a minha hesitação fazia-se sentir entre Freitas do Amaral, Zita Seabra e outros como Durão Barroso, seres de certeza já com o ADN mais completo e alterado com genes de camaleão, que podiam dar ao novo ser a capacidade de melhor se adaptar ao meio ambiente, conforme as circunstâncias.
Acho que para tornar o bicharoco mais convencido também poderia pôr um pouco de Herman José, Paulo Portas ou João Baião, claro desde que não exagerasse na dose, não fosse o bichano começar a andar de marcha a trás.
Por fim, e para facilitar a exportação, colocava-lhe um pouco de George Bush, mas muito pouco, pois já tinha aplicado o Alberto João Jardim e podia começar a cheirar mal. Ou um pouco de Le Pen para garantir que o bicho não gostava de mais ninguém, ou um pouco de Silvio Berlusconi mas muito pouco, por causa de já ter aplicado o Major.

Finalmente, sento-me e reflicto sobre o mundo, onde apesar de tanta coisa importante, como a guerra no Iraque, ou o genocídio na Palestina, hoje não me apetece fazer nem falar de nada. Apenas isso.

terça-feira, novembro 07, 2006

Ama-me

Ando sobre as ondas, como a lua sobre o olhar,
Medindo a altura dos sonhos, pela cor dos sentimentos,
Ando sobre as ondas, somo as nuvens e os momentos.
-
Mesmo antes de poder respirar,
Espero-te na volta das marés, como a lua sobre o mar.

domingo, novembro 05, 2006

Idonea verba


"Quanto mais a mentira se aproxima da verdade, mais a verdade parece mentira"