Mea culpa
Não vale a pena queixar-me, porque de facto a culpa é minha e só minha.
O culpado sou eu se o dinheiro não abunda, porque decidi ganhá-lo em vez de roubar, pois se cada carteira tiver 50 euros, basatava roubar 2 por dia para ter um bom salário.
Se não tenho mais tempo para o meu filho, a culpa é minha por não viver à custa do estado, como indigente ou outra modalidade qualquer.
Se me custa pagar o seguro do carro, o culpado sou eu, porque não aceitei o exemplo do gajo que veio de Angola, tem 3 moradas diferentes e conduz com um certificado provisório inválido porque nunca fez a inspecção anual do carro. E se foi preciso procurá-lo a culpa é minha porque não o acompanhei enquanto a polícia o detinha por excesso de álcool e pedir-lhe a morada quando um juiz qualquer o mandou embora.
Como sou culpado, se a minha mãe não tem nem apoio do estado nem lugar num lar decente, porque decidi não a desamparar, nem que me prive de algumas coisas, em vez de a abandonar para ela ter prioridade na Segurança Social.
Quanta a minha culpa, se decidi pagar sempre os meus impostos, em vez de seguir o exemplo de quem tem mais do que eu e ostensivamente se gaba de não o fazer.
Se este país não está melhor, a culpa é mesmo minha, porque duvido dos políticos, qual S.Tomé, em vez de me juntar a rebanhos de chapéu e bandeira na mão.
Se não sou famoso, nem apareço insistentemente na televisão, mais uma vez sou culpado, porque não me presto a audiências nem entrego o corpo ao manifesto ao sabor de padrinhos de qualquer lobby.
Quando me mostro insatisfeito com a falta de qualidade dos meios de comunicação, a culpa é minha, porque insisto em ser exigente quando sei que o país está em crise.
Quando digo que os nossos irmãos espanhóis estão melhores do que nós, eu devia ter vergonha na cara pela culpa que tenho de como qualquer outro, devo descender de um gajo qualquer que hà uns séculos trás deu porrada nos espanhóis.
Quando vejo malta de África nas esquinas do Rossio, claro que sou culpado, porque também devo descender dum gajo qualquer que também ia numa das caravelas que achou ter descoberto terras de África.
Se sou contra os roubos, culpa minha, pois é o meio mais rápido de transacção na economia nacional, enquanto eu devia privilegiar a performance de actuação.
Se a criminalidade e a violência aumentam, eu devia assumir a minha culpa, porque é o resultado da Sociedade em que vivemos, e eu faço parte dela, logo também sou culpado.
Se o ensino está pior, que culpado eu sou, porque também não sou professor nem ensino nada a ninguém, e se o desemprego aumenta, maior a culpa que tenho porque teimo em trabalhar, tirando o lugar aos outros.
Por tudo isto e muito mais, peço-vos desculpa, pois até pelo desperdício de tempo que dedicaram a ler estas linhas, eu sou culpado.
3 comentários:
Mas não estás sozinho. Divido essas culpas contigo solidaria e irmamente! ;o)
Muito bem escrito como sempre. Mantem-se a ironia inteligente, mesmo quando te sinto triste e desalentado.
Caro Rui,
apesar de não participar neste espaço com frequência, leio-o sempre que me é opurtuno.Parabéns pela maneira como escreves e pelos assuntos diversos e actuais que tens vindo a comentar.
Estou farto de ouvir este povo queixar-se e de ouvir tb os meus queixumes; muitas vezes faço um esforço para não pensar em muitas das coisas que nos rodeiam tal é o nojo que me dão ( particular destaque para a classe politica, impunidades à solta e programas de entretenimento da nossa televisão ).
Tenho a consciência que não devo deixar de reclamar o que em meu entender não está bem, não devo deixar de apoiar tb quem o faz mas,..fico cada vez mais com a sensação que muito pouco muda para melhor e mais justo, que o comum dos cidadãos é claramente ( como eu ), mais um " carneiro " de um enorme rebanho, em que meia dúzia de pastores orientam a seu bel prazer e com critérios de usurpação para si e para os seus.
Veja-se a quantidade de programas televisivos, em hora nobre, para entreter "pobre "; veja-se a qtdd de casos de tribunal( casa Pia é um bom exemplo )que não se resolvem a tempo e horas, ou nunca ?! ; veja-se o discurso dos politicos, e os politicos, sempre iguais e pós eleição, os escândalos, sempre iguais;...
as histórias repetem-se com ciclo muito curtos e as pessoas, ouvem, vêem, reclamam, fica tudo na mm e para a próxima voltam a reclamar e...
Analisando em termos muito latos e verificando a história dos Portugueses ( basta olhar para um passado recente e analisar nas ex colónas, como entramos, o que fizemos e como saímos.. )concluo que há um problema de base, um problema que passa pela vontade ( ou falta dela )das pessoas, um " só não faço se não puder ", um " só não me aproveito se não puder " quando o que deveria acontecer era : temos que fazer, vamos fazer, vamos conseguir, para nós e para os outros...
Não pretendo ter um discurso derrotista mas estou farto de tanta pobreza, " de tudo ", à minha volta; o que mais me custa é não saber e não sentir garantia alguma de que amanhã será diferente ( para melhor e mais justo ).
Um abraço,
MR
o desalento é a lucidez dos resistentes!
divido tudo isto,até se tornar uma fracção infinitamente pequena...
maat
***
Enviar um comentário