quarta-feira, janeiro 25, 2006

Nem só de pão vive o Homem

Um dia, era eu pequeno, um homem bateu à porta de minha casa durante a hora do almoço, mendigando um pouco de pão.
Havendo comida sobre a mesa, o meu pai mandou-o entrar e comer, não apenas pão mas que partilhasse da restante comida que lhe serviria num prato como aos demais.
Ele recusou o prato e o copo de vinho que lhe estenderam os meus pais, justificando-se com a tuberculose de que padecia e do receio de contaminar quem lhe dava de comer. Era a doença que o impedia de trabalhar e de ganhar o sustento.
O meu pai disse-lhe que comesse sem receio à mesa de quem já tivera a mesma doença e que saberia como proceder, pela experiência do passado.
Resignado e mais confiante o mendigo saciou a fome e a sede, sobre aqueles gestos dignos de inspirar a mais solidária das eucaristias e onde qualquer mendigo era elevado à condição de apóstulo numa religião anónima de solidariedade. Mistério, quem sabe, da fé ou da fraternidade.
Hoje já não tenho o meu pai, mas guardo esta recordação dele, daquela situação e do pão e os mendigos continuam a bater à porta de cada um de nós.

Este post vem na sequência da leitura do post "recordação viva de mendigos" no blog "Arde o Azul", cuja consulta recomendo.

sábado, janeiro 21, 2006

Passe ou impasse político ?

Amanhã é dia de eleições presidenciais. Durante estes dias tivémos a oportunidade de assistir ao desfile de candidatos, em postura mais ou menos solidária, qual enlutados num funeral da vaidade, certos no amanhã, do mesmo milagre que ressuscitou Lázaro, para voltarem à cimeira dos castelos e palácios, ciosos da distância que preferem manter no dia a dia, dos que os alimentam e servem, em vez de serem servidos.
Foram beijos nas faces crispadas de peles sem hidratantes, foram apertos de mão e abraços a corpos vergados pela vida dura, com os membros doridos pelo esforço constante da subsistência.
Foram risos e cantares, ao som de flautas mágicas, onde em magotes se procuravam alucinar numa caminhada para a terra dos sonhos, meio embriagados nos almoços e jantares que chegaram aos corpos, cada vez mais distantes das almas.
Mas passado o desfile dos candidatos, faça-se o balanço das dúvidas e das certezas:

  • Que irá mudar com o novo presidente, qualquer que ele seja ?
  • O que realmente diferencia os candidatos ?
  • O que realmente cada um dos candidatos pretende / pretenderia fazer ?
  • O que levou os financiadores a custear as respectivas campanhas ?

À parte do doce direito que a liberdade e a democracia preserva para os eleitores para escolherem, não encontrei respostas claras para as perguntas que deveriam orientar o voto.

Na incerteza quase certa, será que continuarei a ver a Justiça indexada ao porte financeiro, a administração das empresas públicas no rol de jogos políticos, a Saúde em distrações irresponsáveis e a Educação em exercícios de gente inculta e pouco interessada no futuro deste país ?

Tudo isto sancionado em magistraturas do faz de conta, dos favores e da irresponsabilidade das influências mornas do caldo político onde todos se saciam e alimentam ?

segunda-feira, janeiro 16, 2006

Tributo: Maat

Descalço, como que abafando o som dos passos no etéreo, avanço quase a medo, passo a passo em direcção à porta que me separa do outro lado do mundo.
Rodo a fechadura, num teclear de acasos e deixo-me levar num labirinto de valores, onde autores incógnitos passam lentamente a condição de anonimato em passos de magia de luz e de cor, qual campo verde onde factos e opiniões ondulam suavemente ao sabor do tempo, e onde apenas alguns ousam sobressair.
Assim é de facto, quando a luz e a cor se misturam em tons de poesia que nos transportam além da vontade.
Assim é "Maat" no seu "Arde o Azul", onde tudo se mistura numa simbiose doce, qual mistura cordata dos estados da matéria.

Nota: O autor não autoriza a reprodução total ou parcial da imagem exposta, excepto pela visada no artigo.

Maçonaria, Rosacruz ou mais alguém

Sempre tive comigo este defeito de querer saber mais e mais, sem que para isso me tenha lançado em estudos ou leituras, dignos de outros que nisso admiro.
O que aprendi, muitas vezes nem sei como, nem onde, pois frequentemente tive a intuição e a atenção por companheiras, em lições que a vida me foi lançando ao caminho.

Assim, e sem saber porquê, alguns temas me têm soado à memória como que lembrando-me insistentemente para ir ver e aprender, umas vezes seguidas de um desinteresse igualmente súbito, outras para me revestir das roupagens que o crescimento obriga a renovar em chamamentos mais ou menos compreendidos numa descoberta do dia a dia.

É um exemplo disto a "Maçonaria" e "Rosacruz". Não sei bem o que é, nem para que serve exactamente, nem o que as diferencia. Nunca estive intimamente ligado a nenhuma delas, nem cresci em meio ligado ao tema, mas curiosamente os nomes sempre me soaram familiares e continuo na mesma ignorância.

Se nada acontece por acaso, algum sentido deve ter.
Se aprender não faz mal, algo deve ter para ensinar.

Não sei, sei que não sei, mas sei que não saber é a principal razão para aprender.

Caminho

Ando, caminho, e já não corro.
Os pés doem-me e sigo uma viagem a sós,
Olho e conto as pedras que piso a custo,
Umas trazem as outras em voz de coro,
Castigando o curso por onde vou,
Ando, caminho, mas não sei onde estou.

sexta-feira, janeiro 06, 2006

Moi, toi et le vent


J'écoute le vent,
Et il me dit souvent
Que tu n'es plus là,
Donc je m'aperçois
Que tu es partie,
Et la lumière de la nuit
Se finie calmement,

Et nous pleurons souvent,
Moi, toi et le vent.


O autor não autoriza a reprodução total ou parcial da imagem aqui exposta.

domingo, janeiro 01, 2006

2006 - Um novo ano novo


10 ... 9 ... 8 ... 7 ... 6 ... 5 ... 4 ... 3 ... 2 ... 1 ... 2006

Os últimos momentos foram rompendo-se como fios de seda do casulo formado pelo ano que se extinguia como a luz da derradeira vela no altar dos deuses.
Um corpo ora disforme foi emergindo na conformidade da sequência do tempo e as asas foram estendendo-se para abraçar todo o ar que o peito era incapaz de conter, enquanto nas veias o leite e o mel procuravam recuperar uma nova vida ainda por inventar.
Finalmente o tempo chegou no momento em que os olhos voltaram a abrir-se para olhar o horizonte onde a alma já esperava pelas asas que partiram num novo vôo.