terça-feira, maio 30, 2006

Sabedura do Deserto

Eis que me apresento a vós cristandade e mouraria, de meu nome Sheikh Al-Ali Taj Mahal Hamas Adhir Hassim, um vosso criado e figura importante do jet-set, ou seja do camel-set deste deserto, onde as dunas dão vida a este blog.

Quiseram os deuses que periodicamente vos venha comentar de faladura sábia, assim o profeta me inspire.

Sabor a romãs no deserto ...

Pois assim foi, botei os arreios no camelo e fiz-me às caravanas bloguísticas. Passaram luas de caminho sereno, onde o sol me açoitou o cabedal e o couro cabeludo que deste, na verdade se vai rareando, pr'a grande gozo do camelo que acha mais pêlo na cauda do que eu nas latitudes acima dos ombros.
De cansado me encontrara e da areia farto, que teimosa se agarra a tudo quanto alcança, mesmo nos momentos mais íntimos de alívio, moendo-me em comichões dignas de um mártir.

Eis que do alto da bossa da montada avisto fruta madura e rubra quais faces de donzela envergonhada em dia de guloseima. Eram romãs, suculentas, sadias e poéticas que no mais frágil dos cestos brilhavam o blog da Paula. Eram assim, na tribo, conhecidas pelas Romãs de Paula.

Pelas barbas do profeta, pelas almas do deserto e pela comichão que me assola. Acha-se ali ela, em palácios de poesia, num anúncio de uma mulher como as outras, que à cautela avisa caminhar a 300 por cento, enquanto nos embala em poemas das 1001 noites, ou seja 1000 noites porque uma fica de caução, não fosse eu fugir com a mobília.

Dei-me assim por amores por aquela escrita de poesia, que muitos mais comigo se acharam em comentários, onde os nobres filhos da mesma, Rita, Bruno e Gustavo , ganham assento de privilégio na devoção à dança do ventre, donde brotam as palavras em saques de rimas, capazes de encantar até o mais renitente dos dromedários.

Achei-me então de conversa com os céus, sobre tal moura encantada e seus amores, na inquietude de pensar como seria para estes, caminhar no deserto com uma mulher daquelas.
Aquele cabelo da cor e o ondular das dunas, enfeitando uns olhos da mesma cor, capazes de enfeitiçar o mais maricas dos homens e fazer ajoelhar o mais paralítico dos infiéis.

Oh pobre camelo e companheiro, quanto esforço por seguir uma mulher que anda a 300 por cento desafiando a mais resistente das sandálias, até que se gastassem as já curtas pernas, no risco de arrastar os ditos pelo chão.
Oh inclemência do além que no feitiço atormentas em deleites de odalisca com tal escrita aos que ousam chegar a tal oásis de poesia.

(este post é dedicado à Paula Raposo e ao seu blog onde a sensibilidade e a inteligência denunciam uma mulher, que de facto, não é como todas as outras)

sábado, maio 27, 2006

Um povo adormecido, um país adiado

Nunca me moveu nenhum sentimento homofóbico e até confesso admirar alguns homossexuais que numa postura discreta e serena, enfrentam diariamente preconceitos, injustiça e todo um rol de inconsistências sociais, que já deveriam ter desaparecido.
Com efeito, sou dos que entendem por bem, a autorização de casamento entre dois indivíduos do mesmo sexo e não aceito a condenação dos homossexuais por parte da Igreja, pois esta deveria ter sempre uma atitude contra a exclusão social, em vez de a provocar.

Contudo, uma coisa é a orientação sexual de cada um e outra é procurar enfatizar uma postura, não diria "gay" por respeito aos que o são, mas "amaricada" no sentido negativo do mesmo.

Estou farto de ser constantemente bombardeado, sobretudo na TV com palermices mais ou menos amaricadas e/ou mais ou menos anormais, em programas, que supostamente poderiam ser de maior divertimento.
São os "Nunos Eirós", os "Níltons", os "Danieis Nascimentos", os "Serginhos" e os "Cláudios Ramos" que em trejeitos de gosto duvido reduzem à imbecilidade uma actividade, que deveria ser cultural, a de ver televisão.

De facto o nível (ou falta dele) geral dos programas que temos, é tão baixo que levanta questões sobre a sanidade mental de quem permite alguns dos programas nas cadeias de televisão.
São as horas infinitas de telenovelas, apenas entrecortadas por notícias do futebol ou de qualquer desgraça alheia, transformada num circo montado sobre o sofrimento dos outros, qual coliseu romano infestado de aplausos ante o sacrifício dos cristãos.
Claro que todo este bolo condenado a vómito, não ficaria decorado sem o nosso José Castelo Branco, não porque ele seja como é, pois que tal lhe confere o mais legítimo dos direitos, mas porque tal nos encharca constantemente os serões, ora em circos, paradas e quintas, ora em programas sem qualquer interesse ou graça, secundados por grotescos Alexandres Frotas.

Quando foi que qualquer de nós teve acesso a ver na televisão uma ópera ou opereta ? um programa de bailado ? um concerto de música clássica ? um teatro ? um bom programa cómico com artistas de verdade ?
Quando é os artistas para os programas são escolhidos pelo seu real valor e aptidão profissionais, em vez do tamanho do cú ou das mamas, da voluntariedade de se despirem ou supostamente se bamboliarem amaricadamente ?
Quando é que na televisão, um qualquer programa de qualidade deixa de ser visto como uma raridade digna de gravação par ser revista, aliviando os ecrãs privados da nojisse constante na televisão ?

Todos sabemos que esta barbárie, não é um fenómeno isolado dentro da nossa sociedade e nem aparece por acaso.
Todos sabemos que quanto mais embrutecido e ignorante é um povo, menos ele é capaz de pensar e de reagir.
Todos sabemos que quanto mais mobilizados os indivíduos para bandeirinhas, hinos e aplausos dirigidos a selecções milionárias de futebol, menos reagem aos aumentos descomunais de combustíveis ou de bens essenciais.
Todos sabemos que quanto mais absorvidos estivermos com as inaugurações, jogos e comícios, menos nos apercebemos que nos palcos das mesmas, se encontram os que estão envolvidos nos escândalos de "apitos dourados", de "reformas escandalosas", de "processos fraudulentos", de "jobs for the boys" ou de supostos pedófilos, corruptos e corruptores afrontando o poder judicial.

Quantas as bandeiras que enfeitaram carros, janelas e fachadas, a pedido do seleccionador nacional, numa mobilização geral em torno da selecção.
Raras as faixas negras ou gravatas da mesma cor, a sugestão migrada na net, em protesto contra a exorbitância e aberração de algumas reformas atribuídas a alguns políticos.

Não admira ser Portugal o 3º consumidor de alcoól, pois só assim se justifica a embriaguez com que lidamos com a realidade que nos cerca. Só assim se justifica o coma social e não se cumprir o hino que nos impele a ser um "nobre povo" e "levantar hoje de novo, o esplendor de Portugal" numa nova "marcha contra os canhões".

quinta-feira, maio 25, 2006

Fraternidade

É meio-dia e neste momento um amigo de amigos meus foi entre cravos e lágrimas para a sua última viagem.
Não entendo a emoção que sinto, pois eu não o conhecia e pouco ouvira até então, falar dele. Ouço os soluços quase em silêncio dos que o conheciam, na exaltação das qualidades e até talvez dos defeitos, mas sobretudo num dos mais nobres sentimentos que tentam fazer de nós, seres gregários, o da Fraternidade.

Sim, a Fraternidade, esse sentimento, essa atitude, esse princípio, que ao longo dos tempos foi acolhendo as gentes em "famílias", "organizações", "partidos" e "movimentos".
Eram os amigos que se juntavam na alegria e na desgraça, quais "famílias" no sentido lato, que garantiam o que de outra forma era dificilmente alcançável.
Eram trabalhadores que se juntavam e associavam, ganhando força negocial e facilitando o anonimato na luta laboral.
Eram gentes que no desespero diário de sobreviver dão corpo a partidos na ânsia de que profetas políticos lhes ajudem a matar a fome num qualquer 25 de Abril que quase nunca acontece.
Eram pessoas que se juntavam por causas aparentemente únicas, colocadas no vértice duma pirâmide imensa de necessidades de movimentos de ajuda.
Eram... são... e continuam a ser gentes, pessoas a quem a Fraternidade é por vezes a companhia de quem está só, o pão que lhes mata a fome, a mão que os ajuda a levantar, a emoção de chorar em conjunto, o suspirar pelas mesmas dores e o cantar em coro pelas mesmas alegrias.

É a Fraternidade que fez conhecido aquele amigo dos outros que hoje partiu, aquela mulher idosa que dedicou a vida a tratar os abandonados e doentes, aquele homem que deu instrução a quem aprendeu e tantos outros que estão sempre onde os esperam.

Amanhã será meio-dia e depois de amanhã outra vez, e continuará a fazer sentido que pessoas, gentes se juntem, partilhando as dores e os cantares, não porque sejam socialistas, comunistas democratas ou fascistas, não porque sejam portugueses, franceses ou de qualquer outra nacionalidade, não porque sejam brancos, pretos ou amarelos, não porque sejam deste ou daquela sindicato ou religião ... mas porque queiram ser gente, assumir a posição de pessoas, de indivíduos, de serem amigos do seu amigo, de se verem entre si como num espelho e serem capazes de trazer outro amigo também.

(texto dedicado aos que na Fraternidade, na Amizade, na Solidariedade, na Igualdade e na Liberdade encontram a sua postura natural de vida)

terça-feira, maio 23, 2006

Faleceu Fernando Bizarro

Faleceu hoje um elemento muito especial da comunidade Blogueira nacional, Fernando Bizarro do blog Fraternidade, dinamizador dos encontros entre bloggers por altura dos equinócios, como o Blognócio do Outono realizado em Outubro de 2005, o Blogstício de Inverno realizado em Janeiro de 2006 e o Blognócio da Primavera realizado em Março de 2006.

Para os que se queiram despedir do fernando Bizarro, poderão fazê-lo amanhã, a partir das 11h00, na Igreja Velha de Carnaxide.
O Funeral será na Quinta-feira, no crematório do Alto de S. João, às 12h00.

Os que o conheceram entendem por bem, levar-lhe um "cravo vermelho", acreditando que não há flor que ele mais gostasse que lhe levassem.

Eu não tive a oportunidade de conhecer pessoalmente o Fernando Bizarro, embora tivesse várias vezes visto o seu blog Fraternidade. Contudo é também minha, a pena que os meus amigos sentem. Assim, junto ao dos demais amigos e familiares do Fernando Bizarro, o desejo de que repouse em paz, agradecendo-lhe o igual apreço pelo sentido de Fraternidade que lhe era reconhecido.

terça-feira, maio 16, 2006

La mer au milieu

Depuis que la mer est la,
Depuis que ta main me dit au revoir,
et je ne vois pas.

Depuis que les vagues me chantent cette chanson,
en me chantant des mots,
desquels je n’entends qu’un nom.
Un nom qui n’existe pas.

Je cherche et je ne trouve pas,
depuis que la distance existe.
Depuis que la mer est la.


Rui @t Blog, 5-11-1983

Pai: 16-Maio-1921 ... 11-Dezembro-2004


Pai, já cá não estás ... já cá não estamos os três.
Farias hoje 85 anos.
Descansa em paz.

sábado, maio 13, 2006

Fátima, a fé e a religião

Se todos os caminhos vão dar a Roma, naquele recinto, todos os passos se encaminhavam para aquele local apertado, onde as pessoas convergiam quais pequenas crias recolhendo-se nas asas da mãe, concentrando os olhares serenos naquela imagem alva onde as angústias são depositadas em preces confessadas mais ou menos em voz baixa.

A fila de gentes, ora de joelhos, ora de rastos, segue em silêncio o caminho marcado no chão, onde as lágrimas tentam em vão quebrar a dureza das pedras salpicadas das marcas das feridas dos que fizeram das promessas o ponto extremo da sua devoção, seja em agradecimento, seja em sacrifício na busca da ajuda que na probabilidade encontre pouca sorte.

Os ramos de flores emprestam às velas sortidas na forma e altura, com que se cruzam em passos apressados, aromas fugidios que se juntam às pequenas chamas votivas, tentando estas prolongar no espaço e no tempo a recordação dos entes a quem foram dedicadas.

Passam sacerdotes, monges e freiras.
Passam cónegos e auxiliares.
Passa gente de olhar triste, enquanto outros em cantares.
Passam emigrantes, gente simples e gente abastada.
Passam crianças, idosos e outros que já não esperam nada.
Passam polícias, políticos e até ladrões.
Passam até alguns que rezando bem alto, se esquecem da condição de vilões.

Passa aquela mãe que desesperada, veste o filho doente e fraco de anjo, esperando conservá-lo mais tempo com o bálsamo das suas lágrimas, reclamando à imagem de Nossa Senhora a simpatia de quem também já perdeu um filho.

Passam ateus, agnósticos e de outras confissões.
Passa tanta gente, meu Deus.

Porque não ficam ? Porque não estendem no recinto uma longa mesa com pedras de catedrais, onde nos actos votivos e orações, todos se juntam numa primeira ceia, partilhando o pão e o vinho e até as lágrimas e as angústias ?

domingo, maio 07, 2006

Dia da Mãe


Mãe,
eu sei que não irei decorar os beijos que te dou com as palavras que aqui plantei, pois o teu tempo já não se dispõe a ler nem te cobra os cuidados da maternidade.
Eu sei que as flores que te dou hoje já não têm o aroma de outros tempos, nem os espinhos das rosas já te cobram na pele o perfume de outros dias.
Eu sei que que as horas de ontem são apenas imagens que a igual custo guardas hoje e as dores de outrora já não passam o espaço que te guardei.

Mãe,
olha o Sol que já se levantou,
olha as núvens que apenas trazem a chuva que já não te molha, e agora a trovoada é apenas a música descompassada do tempo.
Os cães já não uivam e as hienas já não mordem, e os cuidados que me deste, são agora os teus pelo mundo que te chega por mim.

Mãe,
eu sei que não irei decorar os beijos que te dou com as palavras que aqui plantei, pois agora é meu, o tempo de cuidar de ti.

segunda-feira, maio 01, 2006

1º de Maio

Foi o 1º de Maio dos que trabalham,
foi também dos que não têm trabalho e querem trabalhar,
foi dos que têm trabalho e não querem trabalhar,
foi dos que trabalham e não têm salário,
foi dos que têm salário e não trabalham,
foi também dos que trabalham e temem deixar de trabalhar,
foi dos que querem deixar de trabalhar;

Foi dos que quiseram estar juntos e comemorar,
foi também dos que se separaram e fizeram festejos,
foi dos que não fizeram festa por estarem tristes,
foi também dos que estavam contentes por não festejar;

Terá sido o 1º de Maio ?
Ou foi apenas o feriado do 1º de Maio ?

terça-feira, abril 25, 2006

De 24 ao 26 de Abril

O dia ainda não se tinha decidido a nascer e já a porta denunciava alguém que teimava em bater-lhe com mãos habituadas a tocar de mansinho, de forma furtiva e cautelosa.
- Que é pá ? Que se passa ? Perguntou o meu pai estranhando tal procedimento, antevendo que algo de grave havia acontecido. Ele, que sabia o que valiam aquelas pancadas na porta.
- Não vás trabalhar, parece que houve um golpe de estado. Tenho estado a ouvir a rádio. Acrescenta o amigo aquela preocupação à longa amizade que os unia desde sempre. Aquela amizade que nascera e crescera na cumplicidade de entreajuda ao longo dos anos, sempre que um deles necessitava, sabendo encontrar no outro a resposta que o próprio daria em qualquer momento.
O resto do dia estendeu-se em risos, sorrisos e receios nocturnos que só a insistência dos comunicados veio acalmar como ar novo numa forja já quente ao rubro.

Era o 25 de Abril e era o ano de 1974.
Era a fome e a miséria que alimentavam o dinheiro com que se tomavam as vidas, a liberdade, a saúde e o direito a aprender para saber mais.
Eram os que na calada da noite passavam fronteiras para fugir a guerras que não entendiam, eram pretos que matavam os que como eles também não percebiam.
Eram as bocas que calavam os corpos torturados pelas denúncias dos que pouco ou nada viam.
Eram as cabeças que se vergavam em orações que os adormeciam.

É o 25 de Abril e é o ano de 2006.
A fome e a miséria numa vergonha que já pouco dá para esconder, agora com liberdade para soltar as queixas, continuam a alimentar os que lhes inutilizam as vidas no desemprego e sem meios para poderem aprender mais.
As armas, e as fugas tornaram este silêncio cúmplice dos que converteram as torturas e as denúncias em discursos e acusações repetidos numa cantilena partidária de poder.
As cabeças ora erguidas encondem almas que quedam vergadas quando se privilegia o 24 de Abril na Madeira, quando deputados na falta de vergonha escapam ao trabalho, em suma, quando não se faz justiça.
A solidariedade e a liberdade, voltaram às orações em bocas que continuam secas.

domingo, abril 16, 2006

As últimas ceias

Para os cristãos, Jesus Cristo terá sido o Cordeiro de Deus que foi crucificado para salvação e libertação de todos do pecado, cuja morte terá ocorrido no dia da Páscoa, facto que Ele teria antevisto durante a sua última ceia com os seus discípulos.
Não conheço tradição religiosa com igual paralelo em cada um dos nossos dias, e esse facto faz-me recordar os quantos são diariamente imolados, ainda que sem qualquer propósito de salvação ou purificação.

As ceias repetem-se entre familiares, amigos ou colegas, onde os supostos “Judas” tomam agora os nomes de Bernardos, Jaimes ou Josés, substituindo os beijos da traição, pelas mentiras, falsas acusações ou difamações. Lembro-me particularmente da afirmação de um antigo colega depois de uma dessas ceias de colegas, quando me confessou que se para se “safar” tivesse de “entalar” um colega, não hesitaria em fazê-lo, algo que sem escrupulos, foi demonstrando ao longo do tempo.

Não nos faltam Manueis, Pereiras ou Paulos, que por inveja, despeito ou apenas antipatia, oscilando entre Sinédrios ou palácios, em papeis de Caifás ou de Pilatos, não hesitam favorecer quaisquer Barrabás à mercê dos seus intentos, nas empresas, organizações ou departamentos, com carreiras construídas à custa dos que impune e injustamente condenam.

Não nos faltam sequer os que martirizando os que no trabalho e na honestidade se refugiam para alimentar aqueles que troçando dos Simões e das Verónicas, usam iguais milícias romanas a mando dos que se banqueteiam em repastos dominicais, comendo avidamente os cordeiros já emagrecidos pela aridez da sociedade de que alimentam.

Lembro-me de facto, dos que têm fome, dos que não tendo nada, não se podem sequer sentar à mesa para receber o pão e o vinho que lhes é devido.
Lembro-me dos que, com avidez insaciada, se passeiam impunes nos Sinédrios e palácios onde os discípulos da bondade reclamam justiça, venha ela de Deus ou do Diabo.

Tenham, apesar de tudo, uma boa Páscoa, sobretudo os que de alma livre, fraternalmente enfilam nas hostes a par do Calvário, que os demais teimam em ignorar.

sábado, abril 15, 2006

Judas Iscariote ... vítima da memória curta ?

Sempre vi Judas Iscariote ser remetido para o recanto dos traidores, sendo frequentemente usado como modelo de comparação para aqueles que de algum modo, traiem os que neles confiaram.
A descoberta e divulgação recentes do manuscrito a que se tem chamado de "Evangelho segundo Judas", veio levantar de novo a questão sobre a hipotética traição de Judas sobre Jesus, agora referindo-se que aquele se limitou a cumprir a missão que este lhe confiara, como o derradeiro sacrifício, decerto acolhido com a condenação dos demais discípulos e crentes.

No entanto, há uma questão que sempre me pareceu evidente "que levaria um discípulo, após uma vivência comum com os demais discípulos, certamente com a mesma devoção e fervor, atraiçoar aquele que era o seu mestre, que tanto adoraria como os restantes ?". "Qual a lógica da actuação atribuída a Judas, sabendo o resultado que isso traria ?"

Será que os restantes discípulos de Jesus, esqueceram todo o tempo que viveram em comum com Judas, para o condenar numa actuação inesperada, que aparentemente não compreederam, colocando assim, em causa, num momento, a experiência de anos ? Será que esqueceram todos um dos aspectos que fora ensinado, o da "confiança" ?

Não me parece que o conhecimento do "Evangelho segundo Judas" venha alterar a posição "franchisada" que a Igreja Católica tem vindo directa ou directamente a fomentar. É sempre mais fácil ignorar que corrigir, mas a verdade, essa será só uma , mesmo que leve mais 1700 anos a ser conhecida de todos.

De facto, quantos de nós vimos condenar em momentos, sem piedade, aqueles que durante anos ganharam a confiança, só porque actuaram, aparentemente sem razão ?
Como é curta a memória dos homens, sejam eles discípulos, ou gente vulgar.

Dinastias ...

Apesar de as hostes monárquicas não encontrarem em mim, conhecedor de lógica assumida para tal forma de governar, não significa que o "hábito" torne em "monges" republicanos os que este regime professem.

Quase todos conhecemos o actual pretendente ao trono de Portugal, Don Duarte Pio, Duque de Bragança. Quase todos assistimos ou fizémos parte de expontâneas encenações, fazendo daquela pacata e aparentemente simpática e culta figura, alvo de chacota circunstancial. Ultrages a que a mesma, indiferente, remete ao sorriso calmo e sereno com que convive, mesmo com os que se confessam do outro lado da barricada política.

Talvez aquela serenidade venha de ver a ponte "Vasco da Gama", da principal rotunda de Lisboa "Marquês de Pombal", do centro comercial "Colombo", da casa "Pia", das escolas "rainha D. Leonor" e "rainha D. Amélia" e outras referências ao passado, que o presente não consegue ombrear, mesmo em períodos idênticos de governação. De facto, reconheçamos que perante D. Afonso Henriques, D. Diniz, D. Manuel I e a Ínclita Geração e Marquês de Pombal, a maioria dos governantes do nosso tempo, não passam de políticos da triste figura em posturas de velhos do Restelo, que nenhum Cervantes nem Camões, envergonhados, se atreveriam a imortalizar.

Com efeito, em oposição política à dinastia que o pretendente ao trono de Portugal pretende recuperar, nos submetemos a ciclos políticos que sistematicamente se renovam e renascem, ainda que não por direito de sucessão, mas por convénios de favores e conveniências pessoais.

Assim, a dinastias familiares, alimentamos dinastias políticas, com acólitos que frequentemente a dignidade desconhece, na arrogância do incumprimento do seu dever, perante os que submissos, os alimentam, como já outrora o faziam a outros, reconheço que muitas vezes, com mais sentido de Estado.

quarta-feira, abril 12, 2006

A travessia

Amanhece com o sol a espreitar timidamente pelas janelas que as nuvens combinaram, aspergindo o lugar com um calor calmo, que o crepúsculo teima cada dia em tomar de posse no cacimbo da noite.
O corpo eleva-se lentamente num abandono do lugar onde antes repousara, emprestando a sua forma no leito de areia, num testemunho onde a realidade e o sonho se olharam de frente durante o sono.
Avança solenemente ao compasso do silêncio até à beira da água, pelo caminho que os pés nús foram traçando no espaço que o dia prometeu até à chegada da Lua.
Recolhe-se à pequena barca de madeira de acácia, tomando nas mãos as ferramentas com que há-de dar forma à pedra que o aguarda na outra margem, onde nasce o Sol, anunciado pelo aroma das rosas que o vento transporta no tempo.
Guarda as últimas recordações enquanto se liberta das amarras, para tomar nas mãos o leme que a bondade governa enquanto a vela se ergue revolta, enfunada pela alma.
Por fim, a embarcação avança, na travessia que o prendeu, enquanto as ondas lhe anunciam a viagem até ao porto de abrigo, onde mestres e aprendizes trocam artes e conselhos, num renascimento constante.

terça-feira, março 28, 2006

Um dia para esquecer, ou não ...

Ele há dias que todos gostaríamos de esquecer, e até seria bom esquecê-los, se não fossem úteis a fazer-nos reflectir, mesmo que tal nos faça reclamar de esquecidos.
Mesmo assim, o dia até teria sido sofrível, apesar do desânimo que olhar mais pelos outros que por nós próprios frequentemente nos tráz, se não fora terminar ante o desespero de uma mãe perante a in(certeza) de perder o seu filho, ainda criança.

Não sei o que é perder um filho, e os deuses no mais impiedoso dos castigos, à mais cruel das desventuras me poupem, mas sei o que é aparecer no seio familiar após tal desacerto da vida.

Assim, o regresso a casa após um dia interiormente desiludido, relembrou-me o compromisso de pai, levando-me a conduzir o meu filhote à urgência pediátrica do Hospital de Santa Maria.
Bendito o alívio de ser informado da bondade viral de que o meu filhote tinha sido alvo, mesmo após um par de horas numa sala de espera, em estado condizente com a insuficiência mental do funcionário do hospital e do segurança que lhe fazia companhia.
Não quero e não gosto de menosprezar as pessoas que exercem a sua actividade profissional, excepto quando se sentem ou escudam no cumprimento de um dever, que nem sabem identificar qual é, seja do ponto de vista profissional, seja do ponto de vista humano e/ou moral.

De facto, aguardava a ansiada consulta com o pediatra, numa calma tacitamente assumida perante o barulho saudável das crianças que de pleno direito teimam em sê-lo, indiferentes aos lugares e preceitos.
De repente, uma mãe saía pelo hall de entrada, amparando com as mãos, a cabeça coroada por um lenço, como uma pequena capela deambulante, donde se soltavam gemidos de pranto embrulhados com as lágrimas de mãe. A dor tomava progressivamente a forma de uma cantilena monocórdica e triste, que ela recuperara da memória perdida por terras africanas que lhe deram o ser.
Passados momentos, juntou-se-lhe uma funcionária da limpeza, que igualmente saneando a alma aos que imóveis obervavam sem agir, lhe copiou o abraço que eu lhe queria dar enquanto cuidava egoistamente do meu filhote, emprestando-lhe o amparo que lhe desejava uma mãe igualmente africana, onde a tez escura da pele apenas fazia reluzir a brancura da alma.

Aquele curto espaço de tempo, tanto quanto me permitiu ficar ciente do ocorrido, levou-me a interpelar o segurança e o funcionário da recepção para que pedissem à urgência central apoio para aquela mãe, para que a sua dor e alma se podessem acalmar. Ambos, disseram que não podiam fazer nada, que não sabiam o que fazer, o primeiro representando fielmente a cor escura da farda que envergava e o segundo revelando a aptidão quase irracional que tinha para continuar a agrafar os papéis que segurava na mão, indiferente ao que se passava.
Perante tal estado, a minha repugnância e tom de voz fizeram coro ao nervosismo e à revolta que o desespero que por empatia assumira em forma crescente, exigindo que o cuidado fosse prestado, enquanto o segurança, decerto envergonhado e por insistência quase surda de um polícia que observara o que se passava, me informa então, que o pedido tinha sido feito.

A minha revolta fora entretanto adiada pelo chamamento para a consulta, após a qual, enquanto saía, entrava de novo aquela pobre mãe, amparada pela senhora da limpeza e uma enfermeira que procuravam acalmar aquela dor, que entretanto, silenciosamente também passara a ser minha, e se vergonha e solidariedade houvesse, também passaria a ser de todos os que ali estavam quietos.

Vim-me embora, mas confesso que a dor continua, para aquela mãe e para mim também. Ele há dias para esquecer, ou talvez não.

sábado, março 25, 2006

A culpa foi de Cristo ?!

Há dias ouvi na televisão que as certidões de óbito têm uma validade de 3 (três) meses.

Pois, a maior parte das pessoas dirá que quem determinou a validade das certidões de óbito estava louco ou mesmo embriagado.
Mas não, tratou-se mesmo de uma legislação cautelosa e culta, com uma daquelas culturas que raramente se encontra, tão guardadas estão, que só emergem para actos heróicos, dignos da melhor nata de decisores políticos (claro que não estou a falar de George Bush, mas de algo parecido, em termos de inteligência).

Foi de facto alguém com a visão milenar da experiência.
Pois digam-me lá o que teria acontecido com a certidão de óbito de Cristo ? E a de Lázaro ? E a de provavelmente mais alguns que Cristo possivelmente terá ressuscitado ? Ainda por cima, com a agravante de afirmar que todos se voltariam a ver após a morte.
Claro que o legislador ficou chateado e preocupado com tudo isto, que alguns ainda afirmam.

Sim, Cristo, esse cidadão subversivo que ia contra a ordem instituída, que provavelmente também teria expulso dos templos políticos actuais, muitos funcionários que conhecemos, quando exigem IVA a quem facturou e não recebeu, que teria expulso legisladores que exigem multas insensatas, que teria expulso governantes que se deixam conduzir a alta velocidade nas nossas ruas enquando punem severamente os restantes condutores.

Sim, está escrito o suficiente para determinar a culpa de Cristo, acompanhada dos milhões de fiéis igualmente culpados, que sustenta que os nossos legisladores têm razão na validade das certidões de óbito, talvez no receio, ou na esperança de que, sei lá, alguém do passado ressuscite, para lhes fazer coro num hino ao ridículo.

terça-feira, março 21, 2006

O nascimento do primeiro passo

A realidade ténue e difusa de um mundo fechado altera-se ao ritmo do quebrar da casca envolvente.
Um novo mundo vai-se revelando no novo equinócio, em coro com os sons que se tornaram familiares.

Nasceu para o primeiro passo.
Deu o primeiro passo do seu nascimento.

domingo, março 19, 2006

Dia do Pai

Entre o passado ...

Pai, hoje é o teu dia, agora o nosso dia. Sei que de nada serve o que escreva, pois nunca o irás ler. São apenas palavras mudas como tantas que nunca trocámos, como se tivesse faltado o tempo ou ocasião, neste caminho, onde lado a lado, demos passos paralelos que nunca se cruzaram.
Na verdade tudo o que nos unia, impunha-nos igualmente a distância entre nós , como os carris de uma via que conduz a uma estação de onde todos já partiram.
Não te lembro para te julgar na exigência do que nunca me pudeste dar, nem me sentei na soleira da porta à espera de receber o que não te deram.
Lembro-te sim, no sentir a falta que há muito se fez conhecida, que a condição de filho, indiferente às sortes, foi reclamando ainda na tua presença.
Lembro-te como sempre me lembrei. Recordo-te porque nunca me esqueci.

... e o futuro

Filho, hoje é o meu dia, que um dia será o teu também. Sei que poderá ser importante o que escreva, pois talvez um dia o venhas a ler. São mais do que palavras, são ideias e sentimentos que nos envolvem em cada momento que sentimos, num egoismo que remete longe o que antes fora importante. Tempo, espaço e presença fundem-se numa corrente de vida que se lança indiferente às horas ou momentos, numa descoberta constante de menino.
O teu sorriso lembra-me o mundo que te quero dar, e que os teus braços alcançam no calor do mais sentido abraço, que o tempo não ousa apagar.
Lembras-me em cada passo que dás. Recordas-me hoje para que nunca me esqueça.
Obrigado. Amo-te meu filho.

quinta-feira, março 16, 2006

O vagabundo

Vagueava pela noite. O frio fazia coro com as portas fechadas numa cumplicidade com o caminho por onde seguia, negando-lhe qualquer alternativa àquele percurso que o subjugava.

Ouvia os próprios passos, como se fossem tambores rufando à passagem de um exército que era só ele e as poças de água gemiam reflexos que o denunciavam a cada passo, troçando da solidão que lhe enrugava a alma.

Queria dormir. Queria repousar em qualquer lugar onde a chuva não ocupasse o espaço vazio dos que o deixaram só. Queria parar e aquecer as mãos geladas pelos que sempre admirara. Aqueles que ninguém olha, aqueles que todos ignoram, aqueles que ninguém ajuda. Queria murmurar o mesmo grito que se repetia a cada troar da tempestade que o acompanhava, enquanto cerrava as mãos sobre o peito que lançava à sorte, qual proa de navio onde embarcara os que mais amara.

Apesar de servir junto dos inocentes e de comer do pão dos famintos, queria ainda acolher na alma, todos os que sofrem e dar-lhes a beber o vinho das adegas dos sumo-sacerdotes. Queria agarrar nas mãos os mesmos raios que o feriam e lançá-los a dragões e demónios que de mansinho se lançam sobre os que oram por bem.

Soam-lhe longe os gritos das crianças que com as mãos dadas aos avós, dançam a ronda dos deuses que ele sempre adorara, numa fé que espera encontrar ao virar da próxima esquina.

Continuou a caminhar, mesmo com o declive do caminho a contrariar-lhe a intenção, mesmo com as luzes a apagar-se num acorde mudo com os passos, acentuando a escuridão à qual não consegue habituar-se.
Lança mãos de um espelho, onde não se revê no anonimato da luz que vai reflectindo no caminho, imitando a lua que se evadira no horizonte.

Como está frio, meu Deus, confessa-se-lhe a alma num pranto surdo de silêncio.

terça-feira, março 14, 2006

Assalto à mão "armada"

Sim, é isso mesmo. Hoje fui assaltado à mão armada em pleno dia e numa rua bem frequentada.
Não, não aconteceu em Angola, Moçambique ou na Colômbia. Foi mesmo aqui em Portugal, quando ia trabalhar.
Saio da auto-estrada quando vários elementos de um pretenso bando se fizeram ao caminho de quantos passavam como eu. De repente, um dos elementos faz-me um sinal que não distingui, entre seguir contornando os veículos parados, e parar após os contornar.
Optei pela primeira, mas a visão no retrovisor fez-me mudar de ideias e resolvi dar-lhe a oportunidade de me esclarecer numa atitude calma de "quem não deve não teme", voltando ao local da passagem.
Foi aí que me apercebi que afinal não era um bando de ladrões, pelo menos não estavam a roubar em proveito próprio nem aparentemente por iniciativa própria. Era a GNR-BT que tinha decidido montar a ronda naquele local, dando preferência aos veículos de transporte (que normalmente andam a trabalhar mas que são presas fáceis) e aos que notassem qualquer falta de dístico no pára-brisas, classe em que me incluia.
De facto, o agente que me tinha feito sinal e perante o meu á-vontade de boa fé pelo regresso consciente, simpaticamente me relembrou que me faltavam dísticos no pára-brisas, pedindo a apresentação dos mesmos junto dos demais documentos, incluindo a prova da inspecção do veículo.
Com efeito, tinha todos os documentos necessários e embora tenha concordado com o reparo, eis que afinal não tinha a inspecção do veículo em dia, a que corresponde uma coima de 250 euros.
De facto, embora o veículo tivesse sido inspeccionado há cerca de apenas 9 meses, eu deveria ter ido repetir a inspecção em Janeiro, isto porque uma alma sábia das leis, determinou, não em função do tempo de intervalo entre inspecções, mas que os veículos com matrículas análogas à minha, devem ser inspeccionados em Janeiro.
Ora se o veículo estiver parado por exemplo, por qualquer razão, e entretanto quiser começar a usá-lo em Dezembro, para o que tenho de fazer a respectiva inspecção periódica, esta teria de ser refeita apenas um mês depois, porque a insuficiência racional do legislador assim determinou.
O bom do agente que me interpelou, entendeu que de facto eu tinha agido de boa fé e na suposição de ter de inspeccionar o veículo um ano após a última inspecção (apesar de a informação de Janeiro de 2006 constar no anterior certificado de inspecção a que não tinha dado atenção) e teria tomado apenas a atitude inteligente de dar conhecimento do facto, se não fosse a intervenção do "chefe" que de esporas nas botas, lhe deu ordens para autoar e proceder à extorsão legalmente autorizada, que aparentemente o motivava naquela actuação.
Visivelmente constragido e contrariado pela ineficácia da atitude o agente obedeceu e assim se consumou o assalto que a outros governa e nos colocava a ambos na condição de títeres num teatro bem real, que apenas governantes e algumas figuras públicas ignora em papeis de malfeitores.

quarta-feira, março 08, 2006

8 de Março - Dia Internacional da Mulher

Hoje é o dia internacional da Mulher.

Fará sentido dizer algo ?

Pode-se até falar sobre o Sol, mas nunca conseguiremos imitá-lo.

No silêncio de uma admiração infinita, repousa uma rosa de respeito.

terça-feira, março 07, 2006

A filha perdida

- " Obrigado filha".
Disse aquela idosa, de corpo curvado pelo sofrimento, num olhar e sorriso meigos a condizer com o agradecimento, elevando quem a trate à condição da filha que o destino lhe roubara tão severamente há anos atrás.

- "Filha não, sra. enfermeira. Eu não sou sua filha".
Retorquiu a enfermeira visada, numa relutância bruta e agreste.

- "Tem razão sra. enfermeira, de facto a senhora não tem características para ser minha filha".
Responde-lhe a idosa na mesma voz adocicada pelo ar resignado da perda que teimava em marcar a falta que sentia.
A enfermeira retirou-se da sala e da vida daquela idosa que a presenteara com o que tinha de valor mais elevado.

segunda-feira, fevereiro 27, 2006

Projecto Esperança - Porto XXI - Crianças desaparecidas

Aqui está um projecto, que dispensa outros comentários que o de um forte aplauso.
Parabéns ao autor.



Este cartão vai alternando aleatóriamente entre as diferentes crianças da nossa base de dados. Tem 3 botões, [+Info] para obter mais informação sobre a criança, [Foto] fotografia da criança e [Alert] que permite enviar qualquer informação que possa ajudar na sua localização.


SOS Crianças
Para mais informação visite o site da Policia Judiciária.
CONTRA A INDIFERENÇA!

Amizade no direito e no dever

- Se estivesse no teu lugar, já tinha partido o loiça toda. Não faz sentido o que te estão a fazer. Comenta ele ao amigo num ar de revolta contida pelo alheio da situação, que apesar de tudo, também lhe era próxima.
- Será que vocês não vêem que quem estão a castigar é a ele, não é mais ninguém ? Dirige então a revolta para a companheira, que num silêncio quase envergonhado se quedara até então.
- Não disseste sempre que ele era para ti como um irmão ? Não pudeste contar com ele sempre que precisaste ? Não foi ele quem te ajudou sempre que foi preciso ? E agora que ele precisa, porque não o ajudam ? Isso não faz qualquer sentido. Reitera ele o raciocínio que lhe alimenta a revolta.


- Olha, dirige-se ela ao amigo que perante tudo, se mantém no silêncio que a injustiça desconhece. Eu ajudo-te naquilo que precisares de mim, mas a ela não sinto vontade de a ajudar e não ajudo, pronto. Eu sei que não é fácil para ti, mas não posso fazer uma coisa de que não tenho vontade.

Aquelas palavras ficaram-lhe tão certas e definidas na memória, quanto a certeza de que ela facilmente as iria ignorar na próxima situação em que a necessidade de ajuda não se fizesse tardar.
Seria a amizade um direito que nos permite dizer o que sentimos, ou um dever de impor uma atitude solidária ao conforto de não fazer nada pelos outros ?

- Olha, eu não te pedi nada até agora, mesmo que tenha precisado e não vai ser agora que te vou pedir. As pessoas não mudam de opinião só porque lhes pedimos. Custasse o que custasse, mantive-me de pé e fiel aos meus princípios, dos quais não abdico. Muita gente gostaria de me ver caído ou de joelhos, mas essa mesma gente, na minha situação, provavelmente já teria sucumbido. Não me importa se me ajudas ou não, importa-me quem eu sou, e um dia talvez, se estiveres na mesma situação, então darás valor a tudo o que se está a passar, pois não sei se aguentarás o que eu suportei.

Respondeu-lhe assim, o amigo, mantendo o olhar directo e incisivo, com o sorriso que lhe vagueava nos lábios, daqueles sorrisos calmos que se ganham quando se tem a consciência limpa de se ter feito o que estava certo, mesmo que numa batalha solitária que uma razão, quando incontornável, não deixa perder.

Aquela resposta do amigo, além de selar a discussão, selou algo mais importante, o conhecimento das pessoas, que revelando-se nos direitos de uma amizade, se ocultam nos deveres que a mesma acarreta.
Ela era apenas, mais uma, entre muitas as pessoas que se revelam quando a vida decide levar-nos a exame, nem sempre com os melhores resultados. Ele, de qualquer modo continuaria pelo caminho que a consciência lhe ditara, o de ajudar os que dele precisassem, não por uma qualquer obrigação religiosa, que outros tão facilmente vira atraiçoar, mas por uma questão de princípio, ou talvez de vocação.

Pois, a vida não é algo que se ensina, mas algo que se aprende, ainda que nem sempre da melhor forma.

sábado, fevereiro 25, 2006

Obrigado Luisa e Isidro

A companhia dos amigos torna-se por vezes, desde a diferença nos caminhos que escolhemos até às escolhas nas situações mais dramáticas.
A solidariedade revela-se assim, o résteo alimento para a alma, quando o corpo já sucumbiu, vergando-se ao destino, que sem razão, o impede de dizer não.
Obrigado Luisa e Isidro pela companhia, pela solidariedade e pela amizade.

Au bord de la mer
la vie se tourmente comme les vagues
dans un vol calme de lumière.
Oú le cris triste d’une mouette
s’éparpille dans le vent.

Et tout près de toi,
je n’ai que des mots pour te dire,
ne me quittes pas.


O autor não autoriza a reprodução total ou parcial da imagem aqui exposta.

Assalto à mão "governada"

Não pretendo discutir agora nem a bondade nem a justiça do IVA. Não pretendo discutir nem a necessidade do Estado nem a coerência da aplicação daquele imposto.
Mas, imaginem-se como gestores de uma empresa que presta serviços ou vende bens, numa postura séria e profissional: Imaginem que forneceram bens ou serviços, na forme e termos acordados com os vossos clientes, e que estes, numa atitude inesperada ou até pouco séria não vos pagam as facturas que justa e oportunamente enviaram.

Pois, aí começam os problemas. Quem forneceu os bens ou os serviços, para além de ter suportado em avanço o custo dos mesmos, terá de pagar ao estado IVA correspondente aos mesmos, apesar de ainda não ter recebido do cliente. Este no entanto, e apesar de não ter cumprido a sua obrigação contratual, ou seja, pagar, pode de imediato contar com as facturas para deduzir o mesmo IVA ao Estado.

Para agravar um pouco esta situação, imaginem que o desafortunado fornecedor está em início de actividade, ou seja, já contraiu dívidas na aquisição dos bens ou serviços a fornecer, não recebeu o que lhe era devido pelo fornecimento que fez e ainda por cima, tem de dar ao Estado o valor do IVA que não recebeu e se o não fizer, o Estado ainda o multa e cobra juros de mora.

Resumindo, em toda esta transacção, o único desgraçado honesto foi quem se prejudicou, pois tem de pagar aos seus fornecedores, não recebeu do cliente e se não paga ao Estado, o qual numa atitude mafiosa, nem quer saber porquê e ainda lhe penhora os bens numa situação de que não é culpado.

Qualquer um de nós se perguntará se isto é novo para os ministros das Finanças, primeiros-ministros e demais acólitos que têm desfilado nos sucessivos governos. Claro que não é, pela clara evidência da injustiça desta situação, que infelizmente é comum.
Mas pensem também que aconteceria aos milhões de euros de IVA que o Estado toma de assalto vindos das facturas que o próprio Estado tarda a prazo indefinido, a pagar aos seus fornecedores ? Não assume aqui o Estado um papel pernicioso, ao favorecer os incumpridores, em prejuízo dos cumpridores ?

Isto leva-me a supor que em vez de "Imposto sobre o Valor Acrescentado" o Estado lhe chamará internamente de "Indiferentes Vamos Assaltando".

terça-feira, fevereiro 14, 2006

Poesia nos Blogs

O nosso colega Jorge Castro do blog Sete Mares está a liderar uma iniciativa no dia 4 de Março, digna do maior apreço e adesão, a que são convidados os que tal desejam.
A iniciativa “A poesia nos blogs”, procura difundir aquilo que de melhor cada um sente de si, na forma cantada em silêncio, isto é, na forma de poesia.

As peças poéticas apresentadas no encontro (duas por inscrição) constituirão o acervo que integrará a feitura de um (ou dois, se a quantidade o justificar) volumes do projecto de “literatura de cordel” da Editora Apenas Livros, Lda. (na colecção Literatralha Nobelizável), garantindo a editora, após publicação, um preço protegido por exemplar, sobre o preço de capa, a cada autor.

Dou o maior apreço e apoio tal iniciativa, e embora sinta os apelos que reclamam de mim presença, peço transportem a lembrança, porquanto estiverem presentes, presente também me sentirão, enquanto os recordando também, resto onde e no que sou, uma sombra no deserto que se forma e desforma em areia ao som do silêncio e ao sabor do vento.

Nota: Clicar sobre o título para aceder a informação sobre o evento.

Dia de São Valentim


O tempo corre qual vento no deserto procurando varrer as memórias que obstinadamente teimam em ficar e as dunas tomam a forma de cada mulher que conheci num namoro constante que só o silêncio conhece.

quinta-feira, fevereiro 09, 2006

Tá maluco sr. deputado

De acordo com uma notícia de um jornal diário, o PSD-Madeira solicitou a avaliação das faculdades mentais do deputado do PS, João Carlos Gouveia, na sequência da intervenção deste deputado na Assembleia Legislativa da Madeira, na qual teceu fortes críticas ao executivo e ao sistema judicial madeirenses, afirmando que reina uma oligarquia criminal na Madeira e que existe uma usurpação do poder democrático, fora do controlo constitucional, à margem da lei, sobrepondo-se aos diferentes órgãos de soberania.

Não me importa se aquele deputado é do PS, do PSD ou de qualquer outra força partidária. Importa-me sim que alguém, sem rodeios nem meias palavras e aparentemente sem qualquer compostura de influência, de dedo bem esticado no apontar a quê e a quem, diz o que pensa e dispõe-se ao julgamento público por isso.
Importa-me sim, relembrar quando os políticos eram homens (e mulheres também) e em que isso significava honra e discernimento e em que a palavra se sobrepunha a interesses circunstanciais.

Solicitar a avaliação das faculdades mentais a quem, de alta e boa voz diz o que pensa e o que se passa (supondo a validade das acusações, baseada em factos concretos) é solicitar a avaliação das faculdades mentais de um povo que suporta gente há anos situações que em nada dignificam a classe política nacional nem aos que os sustentam.
De facto é preciso não estar bom da cabeça para alimentar algumas situações.

quarta-feira, janeiro 25, 2006

Nem só de pão vive o Homem

Um dia, era eu pequeno, um homem bateu à porta de minha casa durante a hora do almoço, mendigando um pouco de pão.
Havendo comida sobre a mesa, o meu pai mandou-o entrar e comer, não apenas pão mas que partilhasse da restante comida que lhe serviria num prato como aos demais.
Ele recusou o prato e o copo de vinho que lhe estenderam os meus pais, justificando-se com a tuberculose de que padecia e do receio de contaminar quem lhe dava de comer. Era a doença que o impedia de trabalhar e de ganhar o sustento.
O meu pai disse-lhe que comesse sem receio à mesa de quem já tivera a mesma doença e que saberia como proceder, pela experiência do passado.
Resignado e mais confiante o mendigo saciou a fome e a sede, sobre aqueles gestos dignos de inspirar a mais solidária das eucaristias e onde qualquer mendigo era elevado à condição de apóstulo numa religião anónima de solidariedade. Mistério, quem sabe, da fé ou da fraternidade.
Hoje já não tenho o meu pai, mas guardo esta recordação dele, daquela situação e do pão e os mendigos continuam a bater à porta de cada um de nós.

Este post vem na sequência da leitura do post "recordação viva de mendigos" no blog "Arde o Azul", cuja consulta recomendo.

sábado, janeiro 21, 2006

Passe ou impasse político ?

Amanhã é dia de eleições presidenciais. Durante estes dias tivémos a oportunidade de assistir ao desfile de candidatos, em postura mais ou menos solidária, qual enlutados num funeral da vaidade, certos no amanhã, do mesmo milagre que ressuscitou Lázaro, para voltarem à cimeira dos castelos e palácios, ciosos da distância que preferem manter no dia a dia, dos que os alimentam e servem, em vez de serem servidos.
Foram beijos nas faces crispadas de peles sem hidratantes, foram apertos de mão e abraços a corpos vergados pela vida dura, com os membros doridos pelo esforço constante da subsistência.
Foram risos e cantares, ao som de flautas mágicas, onde em magotes se procuravam alucinar numa caminhada para a terra dos sonhos, meio embriagados nos almoços e jantares que chegaram aos corpos, cada vez mais distantes das almas.
Mas passado o desfile dos candidatos, faça-se o balanço das dúvidas e das certezas:

  • Que irá mudar com o novo presidente, qualquer que ele seja ?
  • O que realmente diferencia os candidatos ?
  • O que realmente cada um dos candidatos pretende / pretenderia fazer ?
  • O que levou os financiadores a custear as respectivas campanhas ?

À parte do doce direito que a liberdade e a democracia preserva para os eleitores para escolherem, não encontrei respostas claras para as perguntas que deveriam orientar o voto.

Na incerteza quase certa, será que continuarei a ver a Justiça indexada ao porte financeiro, a administração das empresas públicas no rol de jogos políticos, a Saúde em distrações irresponsáveis e a Educação em exercícios de gente inculta e pouco interessada no futuro deste país ?

Tudo isto sancionado em magistraturas do faz de conta, dos favores e da irresponsabilidade das influências mornas do caldo político onde todos se saciam e alimentam ?

segunda-feira, janeiro 16, 2006

Tributo: Maat

Descalço, como que abafando o som dos passos no etéreo, avanço quase a medo, passo a passo em direcção à porta que me separa do outro lado do mundo.
Rodo a fechadura, num teclear de acasos e deixo-me levar num labirinto de valores, onde autores incógnitos passam lentamente a condição de anonimato em passos de magia de luz e de cor, qual campo verde onde factos e opiniões ondulam suavemente ao sabor do tempo, e onde apenas alguns ousam sobressair.
Assim é de facto, quando a luz e a cor se misturam em tons de poesia que nos transportam além da vontade.
Assim é "Maat" no seu "Arde o Azul", onde tudo se mistura numa simbiose doce, qual mistura cordata dos estados da matéria.

Nota: O autor não autoriza a reprodução total ou parcial da imagem exposta, excepto pela visada no artigo.

Maçonaria, Rosacruz ou mais alguém

Sempre tive comigo este defeito de querer saber mais e mais, sem que para isso me tenha lançado em estudos ou leituras, dignos de outros que nisso admiro.
O que aprendi, muitas vezes nem sei como, nem onde, pois frequentemente tive a intuição e a atenção por companheiras, em lições que a vida me foi lançando ao caminho.

Assim, e sem saber porquê, alguns temas me têm soado à memória como que lembrando-me insistentemente para ir ver e aprender, umas vezes seguidas de um desinteresse igualmente súbito, outras para me revestir das roupagens que o crescimento obriga a renovar em chamamentos mais ou menos compreendidos numa descoberta do dia a dia.

É um exemplo disto a "Maçonaria" e "Rosacruz". Não sei bem o que é, nem para que serve exactamente, nem o que as diferencia. Nunca estive intimamente ligado a nenhuma delas, nem cresci em meio ligado ao tema, mas curiosamente os nomes sempre me soaram familiares e continuo na mesma ignorância.

Se nada acontece por acaso, algum sentido deve ter.
Se aprender não faz mal, algo deve ter para ensinar.

Não sei, sei que não sei, mas sei que não saber é a principal razão para aprender.

Caminho

Ando, caminho, e já não corro.
Os pés doem-me e sigo uma viagem a sós,
Olho e conto as pedras que piso a custo,
Umas trazem as outras em voz de coro,
Castigando o curso por onde vou,
Ando, caminho, mas não sei onde estou.

sexta-feira, janeiro 06, 2006

Moi, toi et le vent


J'écoute le vent,
Et il me dit souvent
Que tu n'es plus là,
Donc je m'aperçois
Que tu es partie,
Et la lumière de la nuit
Se finie calmement,

Et nous pleurons souvent,
Moi, toi et le vent.


O autor não autoriza a reprodução total ou parcial da imagem aqui exposta.

domingo, janeiro 01, 2006

2006 - Um novo ano novo


10 ... 9 ... 8 ... 7 ... 6 ... 5 ... 4 ... 3 ... 2 ... 1 ... 2006

Os últimos momentos foram rompendo-se como fios de seda do casulo formado pelo ano que se extinguia como a luz da derradeira vela no altar dos deuses.
Um corpo ora disforme foi emergindo na conformidade da sequência do tempo e as asas foram estendendo-se para abraçar todo o ar que o peito era incapaz de conter, enquanto nas veias o leite e o mel procuravam recuperar uma nova vida ainda por inventar.
Finalmente o tempo chegou no momento em que os olhos voltaram a abrir-se para olhar o horizonte onde a alma já esperava pelas asas que partiram num novo vôo.

sábado, dezembro 31, 2005

2005 através da blogosfera

Não queria fechar este capítulo anual sem primeiro fazer o balanço de 2005 neste espaço etéreo em que nos encontramos, qual 5ª dimensão de sentimentos que se embrenham à velocidade do pensamento.
Tudo começou numa incursão quase a medo, acabando numa cavalgada quase desenfreada.
Assim, resolvi destinar alguns destes résteos minutos do ano cessante para os dedicar aos espaços que durante este ano, romperam com a minha relutância à escrita e à criação de algo de novo, quais agentes de conversão a um qualquer credo adormecido.

Cobre & Canela:
Este foi de facto o espaço de onde emergiu quase que involuntariamente o Sombra do Deserto. Visitei-o sob sugestão da Sandra, autora exímia numa arte, onde sendo mestre, se toma como aprendiz. Dificilmente se encontra neste espaço, algo que não esteja escrito com um sentimento forte, algo que não nos surpreenda.
Em suma: Tenho orgulho do trabalho que a Sandra fez.

Riso Cor de Tejo:
Embora o tenha descoberto por contágio, através do Cobre & Canela, este espaço, tornou-se uma visita habitual e constante. Adora-se tudo ou quase tudo o que ali se encontra e confesso-me admirador devoto. Num só recanto, encontramos inteligência, arte, sensibilidade e sentido a tudo o que as palavras permitem.
Em suma: Tenho uma admiração imensa pela Risoleta.

Arde o Azul:
Reconheço que este, foi um dos encontros mais surpreendentes que tive, e que ainda estou em fase de digerir. A empatia de gostos e de afectos, electriza-me a cada encontro, que na frequência, faz parte de uma peregrinação diária, em crescendo exponencial de admiração.
Em suma: Adoro este blog.

As Romãs de Paula:
É no mínimo impressionante, a capacidade e a fertilidade na criatividade poética que se encontra neste espaço, que encontros me fizeram descobrir. Dificilmente tão poucas palavras são misturadas com tantos sentimentos que nos impressionam e deliciam, transportando-nos num carrocel de imagens.
Em suma: A Paula escreve como um vulcão em plena actividade.

Estes foram este ano, os meus espaços de eleição que numa atenção quase religiosa, também me mantiveram neste meu espaço ao longo deste tempo, além de outros afectos, não menos importantes de outros leitores, a quem presto igual atenção.
A todos vós eu marco encontro para 2006, arrogando-me o desejo sincero de vos reencontrar.
Obrigado.

Em resposta à questão que alguns já me colocaram sobre o encontro da irmandade blogueira, acho uma excelente iniciativa, que apoio convictamente. Contudo não estarei presente, remetendo-me teimosamente à sombra anónima de um deserto qualquer.

domingo, dezembro 25, 2005

O meu Natal convosco

Foi assim o meu Natal, que o Pai Natal se dignou a enfeitar com a árvore que fui plantando e cuidando ao longo dos tempos.
Coloquei a árvore num vaso de companhia dos mais próximos, encimada pela estrela de pouco mais de 2 anitos que diariamente me encanta ao som do 76º aniversário da minha Mãe.
Até os ausentes se fizeram sentir, num permanente sentimento de saudade.
Desenhou em cada bola, a face de cada um de vós dos que tornam a minha vida mais colorida e acendeu velas com o calor que alguns de vós me dão nos momentos mais difíceis.
Juntou os ramos com as fitas brilhantes que nos unem e prendeu com pequenos presentes que vocês me dão, em tudo o que me dizem.
Assim, o meu Natal foi mais bonito e colorido, como o melhor dos Natais e o Pai Natal fez-se representar por cada um de vós.

Obrigado e um Feliz Natal para todos.

sábado, dezembro 24, 2005

Carta ao Pai Natal

Querido Pai Natal, eu não sei se existes nem onde moras, por isso escrevo-te sem endereço, na esperança vã que venhas a ler a minha carta.
Dizem que andas muito ocupado, sei lá, talvez também andes em campanha eleitoral à presidência dos Pais Natal, pois andam por aqui outros, que embora se pareçam mais com as renas, também fazem promessas de melhores Natais no futuro, embora no passado, só tenham dados prendas aos que se têm portado mal.
Eu queria pedir-te muito pouco para mim, talvez um Natal com as pessoas de quem gosto à minha volta, pois as outras por vezes é mais fácil não as ver, bastando apagar a televisão.
Pai Natal, como dizem que é época de crise, e como talvez a sintas também na compra de presentes para todos, ou quase, pois há muita gente que merece e não os tem, eu quero fazer-te uma sugestão que talvez ajude a resolver o problema e assim todos ficariam contentes.
Proponho-te que comeces por cima, quer dizer, com os nossos governantes, por exemplo a reduzir o número de ministros, de secretários de estado, de sub-secretários de estado, etc. Assim, com menos ministros para receber, já o senhor Primeiro-ministro tem mais tempo para pensar bem no que anda a fazer, com menos secretários e sub-secretários, já os ministros têm mais tempo para ouvirem as pessoas que eles representam, para saberem o que devem fazer, pois às vezes vê-se mesmo que não sabem do que estão a falar, e com isto tudo era dinheiro que se poupava para verdadeiros presentes para todos.
Como a maior parte das pessoas nem anda de avião, também podes converter o dinheiro do novo aeroporto em hospitais bem equipados, esses sim, já seriam usados por todos e esse era mesmo um grande presente. Também podias desistir do TGV (quer dizer Tontaria a Grande Velocidade) que poucos vão usar, para dar dinheiro às instituições que cuidam dos meninos abandonados ou que são mal tratados ou ainda dos avós que não têm ninguém que cuide deles para que possam viver com dignidade. Eu sei que vais ter dificuldade em explicar a palavra "dignidade" às pessoas com quem terias de falar para fazer isto tudo, mas mesmo assim tem de ser.
Também podias ajudar os senhores que tratam das prisões e que se queixam muito das condições. Olha é fácil, pegavas nos presos todos e punhas-os a trabalhar nos campos, nas serras, a fazer estradas, escolas, hospitais, etc. e só à noite é que voltavam para as prisões, e olha que vinham tão cansados que até iam gostar do sítio onde dormem. Durante o dia, também podias pegar em muitos senhores que vemos quase todos os dias na televisão e mandavas-os para as prisões trabalhar para as melhorar. Assim todos faziam algo de útil e até podias usar aqueles que estão muito aborrecidos e com sono na Assembleia da República, por não terem nada de fazer.
Olha Pai Natal, até podias ajudar aqueles senhores que são acusados de pedofilia. É assim, se eles forem mesmo culpados, quer dizer que gostam mesmo de criancinhas, então ofereces um Pinóquio com um nariz bem grande a cada um deles e quando vieres a minha casa eu digo-te o que fazer com o Pinóquio àqueles senhores.
Pai Natal, no outro dia fiquei muito triste com a última viagem do nosso submarino que já tem 30 anos, e por causa disso encomendaram dois novos submarinos. Já viste que não aproveitaram a última viagem do submarino para o afundarem com muita gente que anda por aí, cheia de prendas que não mereceram ou as roubaram aos outros ? Pode ser que o venham a fazer com os dois submarinos novos, mas acho que ainda vai faltar muito tempo. Há quem ache que podiam usar o dinheiro para outras coisas mais úteis, mas depois, como faziam se nos atacassem ? Se calhar os submarinos até são importantes para alguns dos nossos políticos se esconderem de vergonha nas profundezas, não do mar, mas do inferno.
Tu, Pai Natal, que já estás habituado a voar no teu trenó, tens de ter cuidado, sobretudo no Verão, não vás chocar com os aviões e helicópteros que andamos a alugar para apagar os incêndios. Vê lá tu, que algumas pessoas até acham que nós também devíamos comprar aviões para apagar incêndios. Para quê, Pai Natal, se até existem alguns senhores simpáticos e sempre disponíveis que tratam de tudo, desde a colocar os incêndios até a alugar os aviões para os apagar.
Bom, meu querido Pai Natal, para que não aches esta minha carta muito comprida, eu vou resumir o que eu queria como prenda de Natal. Queria que pegasses em todos os filhos da mãe que andam a infernizar este mundo e nas suas obras e exércitos e os transformasses em comida, água, cuidados médicos e bem estar para todos os meninos, idosos e pessoas boas que existem, e já sabes, se precisares de ajuda, conta comigo, isto se tiveres lugar no teu trenó.

Teu amigo,
Rui

segunda-feira, dezembro 19, 2005

O Natal inocente

Recebi há dias um pequeno postal de Natal, supostamente da autoria do meu filhote de pouco mais de dois anos, sem dúvida com o auxílio precioso da educadora no infantário.
A verdade é que raramente se consegue definir o Natal de forma mais completa, como quando se usam as palavras das crianças, que aqui vos transmito e partilho.




Natal é uma menina,
que me vem dar a mão.
Natal é o Pedro e o João.

Natal é dar um beijo,
pela manhã ao pai e à mãe.
Natal é dar amor a quem
o quer e não tem.

Natal é lá na escola,
quando todos dão as mãos,
abrem a sacola e repartem
o seu pão.

Natal é ÀÀÀ, III, óóó.
Natal é não estar lá.
É estar aqui e não estar só.

sábado, dezembro 17, 2005

O roubo do pinheiro de Natal

Existem histórias que se fundem na imagem de um conto, mesmo que esse conto relate a realidade.

Um olhar atento decorava aquela carita de olhos precoces, onde a atenção a tudo o que o rodeia mal servia para saciar a sede de tudo o que a vista alcança.
Eram tempos em que as ruas e estradas se confundiam com lugares de brincadeira, à míngua dos escassos automóveis que quase envergonhadamente se atreviam nos espaços e vielas do bairro, onde tudo e todos se conhecem mutuamente. Era neste espaço que aquela e outras crianças partilhavam brincadeiras e risos, sob o olhar cúmplice das mães que trocavam cuidados entre todos.
Entre jogos e corridas, aquele menino atrevia-se nas incursões nas ruas e recantos numa descoberta constante de espaços e de novidades.
De repente, quase como que por magia, cuidadosamente empilhados, uns quantos pinheiros, tão pequenos quanto ele, estão quase que envergonhados, lado a lado, num abraço fraternal como os que ele gostava de sentir. Não sabia como tinham ido parar alí, bem próximo da mercearia onde a sua mãe costumava ir. Não percebia qual o sentido de pequenas árvores que costumava ver no pinhal, que julgava ser de todos, irem para às ruas, aparentemente abandonados, à espera que algumas pessoas lhes pegassem, quase sempre com um sorriso nos lábios para os decorarem com requintes multicores, quase sempre acompanhados de presépios mais ou menos encenados, que ele se habituara a ver nas casas dos amigos com os olhos arregalados.
Assim, aquele aventureiro de poucos anos arma-se de um andar discreto mas decidido e decide-se pela indecisão até chegar a casa entre dois dos mais formosos pequenos pinheiros que segura nas duas mãozitas que a custo os arrastam. Naquele ano também a sua casa iria ter um pinheiro de Natal.
Chegado a casa, concluiu a sua escolha do pinheiro da sua preferência, que decidiu esconder debaixo da cama para surpreender os pais, remetendo o outro para aquele idoso que ele conhecia vagamente e que o vinha secundando nos passos, perguntando-lhe onde fora buscar os pinheiros. Contente e feliz, partilha com ele aquele pinheiro, enquando de dedo esticado aponta onde o idoso poderia buscar mais se quisesse, eventualmente para dar a outras pessoas, que como ele, nunca tinham tido um pinheiro de Natal. O idoso aceitou o pinheiro afastando-se em direcção aos restantes.
Surpreendida e visivelmente preocupada, a mãe obriga-o quase ameaçadora, a dizer onde tinha ido buscar aquele pinheiro. Inocente e frustrado, indica o local onde os pinheiros de natal se ofereciam a quem os quisesse. O caminho fez-se de volta, obrigado, de novo com o pinheiro que adoptara diante do ar zangado da mãe, numa atitude que não compreendia. Ali estava de novo o idoso que antes vira e a quem não entendia porque a mãe lhe pedia desculpa, enquanto o açoitava por uma culpa que não conhecia.
Entre as lágrimas, a dor mais forte era a de não compreender, porque não tinha ele um pinheiro de Natal como as outras crianças ? Afinal de quem são os pinheiros que ele costuma ver nos pinhais ?
Resignado, esperou mais uma vez por aquele dia mágico em que de manhã bem cedo iria à cozinha buscar o brinquedo que o menino Jesus lhe teria deixado, mesmo que fosse sem árvore de Natal nem presépio, mesmo sem festa e sem a família reunida, apesar da sua mãe fazer anos naquele dia.
Entretanto e sem resposta às perguntas que não fizera, um dia chegou a casa, onde surpreendido, encontrou um pequeno pinheiro que se esforçava para brilhar num pose de vaidade, com serpentinas de brilhantes e bolas de várias cores com que a sua mãe enfeitara, que apesar do esforço já não lhe fazia arregalar os olhos, embaciados por tudo o que não compreendia.

sábado, dezembro 03, 2005

A caminhada

A sombra teima em seguir os passos, cada vez mais compassados com o cansaço. O sol e a chuva guerreiam-se pela liderança dos dias e o vento e o pó juntam-se-lhes no endiabrar das horas.
Carrego nos braços um album de fotografias onde as pessoas ganham vidas novas, trocando-se nos planos da imaginação e da lembrança.
Vejo-te nelas numa imagem a preto e branco esfumando-se em positivos e negativos condenados ao passar dos tempos, em que a lembrança se torna cúmplice da sombra que se projecta no caminho, qual mensagem que não se apaga na memória, num repetir constante:

- Se eu cair, não me levantes, se quiseres que seja meu o teu caminho;
- Se eu tiver fome, não me dês a comida que me queiras cobrar;
- Se eu tiver sede, não me dês de beber a água que não é tua;
- Se eu sofrer, não me consoles, se assim me queres comprar a alma.

A caminhada continua, dia após dia, duna após duna, onde o caminho a custo segue a lineariedade da alma. Na areia, o caminho andado deixa a mensagem "quando te lembrares de mim, verás na fraqueza dos que se quedam, a fortaleza dos que caminham".

sexta-feira, dezembro 02, 2005

Viva a "vida"

Ontem, após ter ouvido na rádio os comentários de uma qualquer organização de carisma ético e religioso, que se afirmava contra a criação de embriões como fonte de células estaminais, mesmo com fins medicinais, imaginei como seria usar in-extremis, alguns argumentos sobre a preservação da vida.

“Acordo cedo e ainda estremunhado, sigo a peregrinação diária à casa de banho. Acabo de evacuar e numa devoção inabalável, apanho todo aquele esterco cheio de matéria viva (sim, porque as bactérias também são seres vivos) e coloco-o cuidadosamente no quintal, no pouco espaço livre deixado pelos dias anteriores.
Faço a barba, mas recuso-me a lavar os dentes, com receio de aniquilar as pobres bactérias que me profanam a placa dentária. Até parece impossível como numa universidade portuguesa, pretendem criar uma vacina contra as bactérias que provocam as cáries. Cambada de assassinos.
Reduzi o pequeno almoço ao leite com café e o pão foi deixou de levar fermento, pois para quem não sabe, a fermentação baseia-se no trabalho desenvolvido por bactérias.

Está a chover, descalço-me e saio num bailado cómico para evitar pisar aquelas poças de água preciosas cheias de vida microscópica. Sim porque o tamanho pequeno não retira a dignidade e eu que o diga, pois apenas meço 1,69 m.
A custo lá cheguei ao carro e em ziguezaques conscientes sigo o caminho pelos pedaços secos da estrada.

A entrada no escritório é atormentada pela senhora da limpeza, que com ar cúmplice e criminoso, atira a sua fúria contra os pobres ácaros que angelicalmente povoam tapetes, cadeiras e sofás. Tanta maldade meu Deus, que aquela pobre mulher tem de expiar.

Chega a hora do almoço e numa fé que não desiste, renunciei ao habitual pernil assado no forno com batatas fritas e ao peixe cozido com todos. Só os nomes, exalam criminalidade. Sim porque, ao menos podiam ter chamado “membro inferior do porco, sujeito a temperatura mais elevada, com batatas passadas com óleo aquecido” ou “peixe mergulhado em água agradavelmente aquecida acompanhado com alguns legumes e batatas igualmente aquecidas”. Acabei por comer meia salada, ou melhor, partilhei a outra metade da salada com a pequena mas venerável lagarta que piedosamente devolvi ao jardim mais próximo, perante o ar estupefacto dos demais clientes. A sopa de legumes (que outra poderia comer ?) acabou por ser recusada, perante o crime que os cadáveres dos minúsculos seres a boiar denunciavam. A refeição terminou com um inocente café.

Terminado o dia de trabalho, o regresso a casa fez-se cheio dos mesmos cuidados da ida, agora mais carregado das fezes fielmente recolhidas durante o dia, para então as depositar junto das matinais. Quase podia ouvir o contentamento dos microorganismos que populavam a área de despejo.

Durante o jantar, tipicamente vegetariano, assisto a um telejornal que mais me enerva sobre crimes horrendos como a pesca e a caça. Como é possível matar tanto ser vivo, mesmo com a desculpa de alimentar muita gente. Como não fazem como eu ?
E ainda por cima, pretendem criar embriões ? Mesmo que sejam apenas dezenas ou centenas de células ? Nunca. Resignem-se ao que Deus criou. Deus sabe o que faz concerteza, pois até me criou a mim.

E nem falemos em abortos, nem que se tratem de fetos com dias ou mesmo horas de vida. Nada deve destruir o que Deus criou. Se tiverem de sofrer, pois que sofram, pois sempre ouvi dizer o senhor padre que sofrer purifica a alma e que Cristo também disse 'venham a mim, os que sofrem'.

Hoje calhou a dormir sozinho, porque a minha mulher foi visitar os pais. Ainda bem, não fosse ela querer que eu condenasse à morte alguns espermatozóides, o que para mim estaria fora de causa. Já basta a insistência dela em limpar a casa, numa orgia satânica contra as bactérias, vírus e ácaros.
Até o pediatra do meu filho participa na conspiração anti-vida quando receita antibióticos, quais bombas de napalm e até essas já foram proibidas. Claro que como tudo na natureza, aqueles seres minúsculos também se vingam, claro, e as bactérias multi-resistentes que o digam.

Matar, nunca. Mantenho-me numa fé firme e hirta, como uma pedra num imensa pedreira cheia de calhaus esclarecidos e conscientes como eu”.

quarta-feira, novembro 30, 2005

Ao telefone com Deus

Os dedos calcorrearam o teclado, marcando um qualquer número desconhecido ditado pela ânsia só permitida quando a ligação se estabelece baseada em convicções ou falta delas quando apenas se ouve a própria voz do outro lado.
Éramos alguns, decerto muitos e talvez muitos mais, os que em línguas, dialectos, linguajares e intenções nos precipitávamos para ouvir quem atendesse, ora em chamamentos, ora em orações de gente apinhada em credos que ora unem irmãos, ora afastam infiéis.
Em anonimato de silêncio, encontrei a minha voz junta aos ouvidos atentos às respostas para as perguntas que ousara colocar:

- Porque sofrem as crianças, idosos e mendigos, às mãos dos que os deviam cuidar ?
- Porque matam, os assassinos, inocentados nas inércias das nações ?
- Porque acusam, os que são culpados, amnistiados nas cumplicidades dos políticos ?
- Porque guerreiam, os que os inocentes não satisfazem com as suas vidas e o seu sangue ?
- Porque roubam, os que já muito tendo, apenas partilham a má sorte ?
- Porque têm fome, os que servem a fartura ?
- Porque proclamam humildade, os que se fardam na opulência ?
- Porque rezam os infiéis ?

Terá respondido Deus, em palavras facilmente entendidas por quase todos à minha volta, cristãos, judeus, muçulmanos, hindús, budistas e outros crentes que em clamores de entendimento, remeteram ao silêncio o meu sentimento de não ter compreendido as respostas.

sexta-feira, novembro 25, 2005

Vazio

Faz hoje um mês que publiquei o último artigo. Faz hoje um mês que o vazio tomou a forma da incapacidade de dizer e escrever algo com sentido, qual final de viagem que termina num adormecer que não dá descanso nem quietude.
Foi longa a viagem após ano e meio, e duros os dias e as horas que se sucederam em catadupas de episódios onde não faltou a solidão, o sofrimento e a má vontade que caracteriza os que angelicalmente infernizam a vida a quem por vezes tanto devem.
Foram tempos, onde a ignorância dos factos condecorou falsos juizes, mais apressados em acusar que julgar, em orgias de maldade.
Foram tempos, onde apenas a dignidade e a hombridade renitentes, sustentaram intransigentes, cada momento para dar lugar ao seguinte, sempre igual ao anterior.
Foram tempos onde conhecidos, amigos e inimigos se denunciaram em quem se alheou, em quem acompanhou e em quem virou as costas.
Relembro com apreço alguém em particular que em face dos anos convividos, não hesitando se colocou ao lado, confiante no discernimento que o mérido demonstrado durante anos, não permite duvidar aos que premeiam os mesmos princípios de justiça, que apenas a afinidade de cunhado, me impede de chamar de irmão, de quem, fartos ensinamentos o destino me concedeu.
Resta portanto, deixar que o pó que por despeito outros levantaram, assente, sepultando os acólitos do mal, tornando mais fértil o caminho por onde a dignidade caminha.
Resta portanto, deixar aos deuses a justiça que os homens não sabem fazer.

Dedico este artigo ao meu cunhado, com quem tenho a honra de partilhar uma profunda amizade e princípios de vivência e com quem tenho aprendido muito ao longo destes anos, tendo-se tornado para mim, uma referência de dignidade e de justiça. É de facto, e tem sido, uma das pessoas mais importantes na minha vida e de quem mais gosto, o que espero, se venha a estender ao meu filho, como eu gosto do meu sobrinho.
Obrigado Anselmo, fizessem os deuses de ti, o irmão que eu gostaria de ter.

terça-feira, outubro 25, 2005

Hoje não há luar

Hoje levei a minha mãe para o lar.
Hoje os muros cairam e as portas franquearam-se às dunas dum deserto imenso que pouco a pouco toma conta de tudo à sua volta.
Hoje as hienas não gritam, dormindo onde os leões se deitam.
Hoje os sinos não tocam, e as beatas lançam penas de neve sobre as fogueiras, cansadas da ronda das bruxas.
Hoje descansam os que se quedaram e quedam inquietos os que não se tolheram.
Hoje a noite é calma e o silêncio deixa ouvir o bater dos corações.
Porque hoje não há luar.
Porque hoje levei a minha mãe para o lar.

domingo, outubro 23, 2005

O Anjo da Guarda

O despertador teimosamente assinala a sua presença, sem dar ares de desistir do seu intento. Como são insistentes estas pequenas criaturas sem vida, como se fossem suportadas em necessidades de auto-flagelação.
Os olhos teimam-se-lhe em não se abrirem para mais um dia igual a tantos outros, mas em que ser diferente nem sempre significaria ser melhor ou mais agradável. O corpo, a mente e a alma juntam-se sindicalmente na inércia de não acordar, enquanto os pés num esforço insuportável os remetem para o início da alvorada.
A saída de casa faz-se repetidamente em jejum na breve caminhada à casa da mãe, num acto devoto de fé inabalável. Encontra-a na cama, qual bela adormecida, onde a beleza daquele altar foi condensado no sorriso matinal de o rever, como se tivesse terminado o mais injusto dos degredos.
Ajuda-a a levantar-se e enquanto descobre entre fraldas e mudas de roupa, cuidados dignos do mais frágil dos seres. Assim, entre trocas de sorrisos cúmplices, os escrúpulos apenas decoram o saldo ainda grande, da dívida que nunca poderá pagar do carinho que outrora recebeu do mesmo modo.
Prepara-lhe o pequeno-almoço que decora com os fartos medicamentos e repetidas recomendações que a fraca memória teima em ignorar, a que junta o telefone na proximidade à espera de contactos que nunca chegam.
Troca a roupa da cama e lava a pouca loiça, como se quisesse apagar o testemunho da refeição anterior e sai com a mesma ligeireza com que entrou, depositando um beijo de oração, como se aquele ou outro qualquer pudesse ser o último num jogo de sorte e azar que não controla.
O dia decorre no temor ao toque do telefone, onde olhares furtivos acompanham anseios de aquele número familiar não aparecer no pequeno ecrã, pois seria sinal de que algo acontecera e que uma vez mais iria de urgência assistir à mãe após uma queda, rezando para que não tivesse o resultado mais temido.
Findo o dia, quando a Lua veio fazer o render ao Sol que se manteve fiel à guarda àquele templo de fé, volta após viagem onde os olhos assistiram à revelia numa condução dificilmente cuidada pelo cansaço.
Os olhos dela iluminam-se como se tivesse regressado da mais longa das viagens e onde os minutos aspiraram à condição horária.
Encontra-a sentada à mesa que em parceria com a televisão a assistem quais companheiros fiéis durante todo o dia. Aquece o jantar que as senhoras da assistência ao domicílio numa mesma devoção prepararam, e enquanto a vê comer, os seus olhos levam a melhor num intervalo de sonolência a que se abandona por momentos de vigia para assegurar-se que aquele sustento cumpre a sua missão.
Finda a noite, os cuidados repetem-se entre fraldas, cremes e deposita-a suavemente sobre o leito que a acolhe num aconchego quase maternal e onde um beijo na testa sela a atenção mais filial.
- És o meu Anjo da Guarda. Diz-lhe ela com aqueles olhos pequenos e meigos, castigados pelos óculos que lhe levaram o brilho, que ela sabiamente guardou no sorriso que enfeita aquela face onde as rugas assumem o papel de pergaminhos na mais sábia das bibliotecas.
- Era bom era, se o fosse, mas não sou. Quem o é, é quem a tem salvo no hospital e quem a trata durante o dia. Eu não estou a fazer nada de mais. Responde-lhe ele com um sorriso franco, escondendo a emoção de gratidão a quem deve tanto.
Sai num adeus sempre incerto do que acontecerá a seguir, deixando a porta franca, para que qualquer pedido de ajuda permita a quem passe intervir e o chame no número que mantém junto ao telefone.
Caminhando ao som dos seus passos, a sua sombra denuncia-o no muro que o conduz, como se sentisse a sua própria presença. Sente a caminhada ligeira de um peso mais leve, como se a sua alma o fizesse flutuar e aligeirasse a carga ou alguém o ajudasse a caminhar. Continuamente descrédulo, vira-se teimando em não ver nem ninguém nem nada a não ser algumas penas caídas no chão que lhe traçaram o rasto.Volta a percorrer de regresso, aquele corredor estreito e interior onde apenas a Lua brinca com as poças de água no chão em reflexos de saudação que o olhar dele devolve em sinal de cumprimento e de gratidão aos deuses por se ter repetido mais um dia e mais uma vez aquele acto de devoção, lembrando-se das palavras da mãe, condimentadas pela recusa dele ao mais provecto dos agradecimentos.

sexta-feira, outubro 21, 2005

Cara de pau

Apesar de não ser apreciador de futebol, confesso que o tema que aqui comento, me despertou especial atenção, senão vejamos:

  1. O treinador do FCP, Co Adriaanse, diz que se os adeptos não o quiserem, basta exibirem lenços brancos ou assobiarem, que ele entenderá a mensagem e abandonará o seu posto no clube.
  2. A seguir, no jogo SLB - FCP em que o primeiro derrota o segundo, adeptos deste envergando camisolas do clube, exibem ostensivamente lenços brancos.
  3. No final do jogo, Co Adriaanse diz que nunca disse que se iria embora se os adeptos acenassem com lenços brancos e que não viu adeptos do FCP com lenços brancos, mas sim, adeptos do SLB, mantendo-se no seu posto.
Isto, de algum modo, retrata o futebol português numa simples personagem, que curiosamente nem tem nacionalidade lusa.
O incidente nem teria tanta importância se não nos tivéssemos já habituado a ver o dito por não dito, diariamente, onde dirigentes, treinadores, jogadores, árbitros e adeptos se pavoneiam em discursos amolgados e velhos, disfarçados de renovadas esperanças para consumo geral e proveito de alguns, tudo isto, condimentado com plena falta de vergonha de quem pôe a cara diante de um público tristemente apático.
É preciso ter cara de pau para, com uma integridade gelada, derreter-se no calor dos interesses e na falta de vergonha do esvaziar de valor sobre a palavra que se dá.
Quanto vale a nossa palavra ? Quanto vale a mentira ? Quanto vale a honra ?
No futebol, muito pouco, de certeza.

"Um homem sem palavra é um homem sem alma. Um homem sem alma, não chega sequer a ser Homem"

segunda-feira, outubro 10, 2005

Idonea verba

"Atrás de nós virá quem pior fará"

É o que o povo diz, e confesso, com alguma razão. De facto quando ouvi a notícia de que foram gastos 118 milhões de euros na propaganda para estas eleições autárquicas, repito cento de dezoito MILHÕES de euros, fiquei estupefacto.
Significa que se formos 10 milhões de portugueses, convictos ou não, eleitores ou não, cada um de nós, contribuiu de forma directa ou indirecta, com pouco mais de 10 euros para a propaganda eleitoral destas eleições.
Eu gostaria de dizer que não contribui, mas que fui expoliado de pouco mais de 10 euros para uma campanha que me deixa triste com o que assistimos.
Será que todos os portugas que temos visto aos pulos com bandeiras de cores e sorrisos de quem lhes bate e gosta, a quem apenas a ausência do apêndice anal os distingue de cachorros a saltitar em redor dos donos, ansiando por alguns restos dos pratos, de preferência acompanhados de algumas festas, não têm a consciência de que cada um daqueles euros, ao fim e ao cabo são pagos por todos ?
Será que não têm a consciência de que quem contribui com dinheiros para campanhas, espera algo em troca, e normalmente muito mais, e sempre em prejuizo de outros ?
Será que aquele dinheiro não poderia ser aplicado em obras de valor inquestionável ?

Pensem nisso enquanto esperam nos hospitais durante o inverno e com o aquecimento desligado por falta de verbas.
Pensem nisso enquanto não recebem a devolução do IRS que lhes tarda.
Pensem nisso enquanto pagam o IVA ao Estado apesar dos fornecedores não pagarem.
Pensem nisso enquanto não sentem que têm direito tudo aquilo que a Constituição nos consagra, por falta de verbas.

Em que pensarão os que se abstiveram ? Talvez que não tenham visto alterativas credíveis. Talvez não sirvam meramente para avalistas de um acto eleitoral conspurcado. Talvez não sirvam para receber beijinhos, electrodomésticos, bonés ou até mesmo chouriços.

Pensem nisso,... ou até noutra coisa qualquer,... desde que pensem, já não é mau.

segunda-feira, outubro 03, 2005

Esquerda vs. Direita passando pelo Centro

Sempre optei teimosamente e de forma quase fundamentalista pela isenção política e pela dolorosa mas reconfortante verticalidade de princípios.
Assim, e para desamparo de muitos, tem sido tarefa hercúlea para alguém, posicionar-me na geografia política.

Dizem que sou de esquerda se compreendo trabalhadores que decoram as mãos com os mesmos calos com que acariciam os filhos que fascinados voltam de escolas mal equipadas. Ou quando as atitudes de gestão se baseiam no estatuto social, varrido a desconhecimento do tecido produtivo que suporta a mão-de-obra deste país, em critérios que remetem ao anonimato de números aqueles pequenos grandes seres que diariamente sonham, trabalham, riem e choram como os demais.
Serei de direita quando acuso os baixos índices de produtividade ou algumas teimosias cegas sindicais, ou quando a mobilização das massas produtivas visam a melhoria conjunta de resultados.
Colocam-me ao centro quando, indecisos, os conceitos se misturam em atitudes de senso comum.

Posso ser o que quiserem, mas sei que uma coisa nunca serei, aquilo que os outros querem que eu seja.